Nº 2 - abril 2011

Ana Romão,

Academia Militar

Dalila Cerejo

CESNova – FCSH-UNL

Helena Serra

SOCIUS-ISEG

Luís Baptista

CESNova – FCSH-UNL

Manuel Carlos Silva

CICS – Universidade do Minho

Os artigos que a seguir se apresentam resultam da conferência Institutions and Social Change (s) in Southern European Societies, que decorreu em Cascais, nos dias 1 e 2 de Outubro de 2010, e foi co-organizada pelo Research Network on Southern European Societies (RN27), da European Sociological Association, e pela Associação Portuguesa de Sociologia (APS).

Na referida conferência e de acordo com princípios de valorização da pluralidade linguística nos intercâmbios científicos, as comunicações puderam ser apresentadas em inglês, português, espanhol ou francês, pelo que a publicação dos textos seleccionados manteve os mesmos critérios.

Muito embora os autores portugueses estejam em maioria, apraz registar a contribuição de autores de outras proveniências, assim como é de realçar a perspectiva comparativa que alguns textos praticam. No seu conjunto, estas condições propiciam olhares enriquecedores sobre o tema geral Instituições e Mudanças Sociais nas Sociedades da Europa do Sul.

Um primeiro bloco temático centra-se na Família e Juventude, reunindo sete artigos. No primeiro, “Gender, work and family: balancing central dimensions in individuals’ lives” Anália Torres, Cristina Marques e Diana Maciel abordam o modo como em Portugal os homens e as mulheres articulam as suas vidas, designadamente no mercado de trabalho, na conjugalidade, na parentalidade e nas tarefas domésticas.

No segundo artigo, “Family, disability and social policy in Portugal: where are we, and where do want to go?”, de Paula Campos Pinto, também se consideram as questões de género na vida familiar, mas a abordagem centra-se especificamente nas famílias com crianças necessitadas de cuidados especiais. A análise convoca as interconexões entre recursos do estado social, género e família, explorando as consequências dessa triangulação para quem assegura os cuidados e para quem deles necessita.

O terceiro artigo, “Casamentos mistos em Portugal: evolução e padrões”, de Ana Cristina Ferreira e Madalena Ramos propõe uma análise quantitativa dos casamentos ocorridos em Portugal, entre 2001 e 2007, nos quais um dos cônjuges nasceu em Portugal e o outro é originário de país diferente. Além de explorarem a frequência deste tipo de casamentos e de caracterizarem os respectivos cônjuges, as autoras procuram encontrar padrões de acordo com as diferentes comunidades de imigrantes.

Também o artigo de Sofia Gaspar, “Comparing EU bi-national partnerships in Spain and Italy”, estuda as uniões de dupla nacionalidade, mas focaliza-se apenas nas uniões entre parceiros de diferentes nacionalidades da União Europeia; usando dados de inquéritos internacionais, procede a análise comparativa entre as realidades espanhola e italiana, chegando à definição de três perfis que discute à luz da literatura sobre família, migrações e integração social.

Ainda neste bloco, mas atendendo às situações dos jovens e aos universos juvenis, apresentam-se três artigos. Maria Tsekoura, no texto “Promoting ‘Youth Presence’? An exploration of youth participation in the UK and Greece”, propõe-nos uma visão crítica das condições institucionais destinadas a promover a participação juvenil, comparando experiências da Grécia e do Reino Unido. Os dados reunidos, embora assinalem diferenças entre as duas realidades, levam a autora a concluir que os modelos de participação são mais orientados para aspectos de ordem individual, incorporando mais a conformidade às normas sociais do que potenciando a crítica e a mudança.

No texto Jovens da Europa do Sul num contexto de mudança social: dados portugueses”, Inês Vieira e António Cardoso recorrem aos inquéritos aplicados aos participantes no Dia da Defesa Nacional, para traçar um perfil da situação juvenil, de 2004 a 2009. Examinam algumas aspirações dos inquiridos, bem como exploram atitudes, atendendo às variações de género e à diversidade regional.

Por fim, o texto de Albino Cunha, “Percepções/representações dos jovens portugueses, espanhóis e franceses entre si e sobre o ‘outro’” explora a percepção que os jovens de cada país têm em relação aos outros países em estudo, ao mesmo tempo que procura identificar a existência de referências culturais mútuas, enquadrando-as no contexto escolar.

Democracia e Participação Política, o tema do segundo bloco de textos, engloba três contribuições. No primeiro artigo, “Entre o velho patrocinato e o clientelismo político-partidário: o caso de uma aldeia minhota no concelho de Barcelos (Portugal)”, António Cardoso e Manuel Carlos Silva começam por enquadrar os processos de transição numa comunidade agrária, mas o essencial da análise acompanha as mutações do tradicional patrocinato eclesiástico rumo a outras formas de clientelismo, designadamente as que decorrem das fidelidades partidárias.

O segundo artigo, “The institutionalization of Roma social participation in Southern European Societies – preliminary data from an ongoing research” de Raquel Rego e Claire Auzias, trabalha alguns indicadores de participação social nos países da Europa do Sul, focalizando-se particularmente na expressão e na actividade das associações relacionadas com as populações ciganas, ao mesmo tempo que procura caracterizar o papel destas na integração social das populações em causa.

Por último, Célia Belim Rodrigues no texto “A Qualidade Informativa e de Liberdade de Imprensa e a Mudança Social – O Norte e o Sul da Europa em Comparação” reúne alguns indicadores sobre qualidade da imprensa em países do Norte e do Sul da Europa, relacionando as tendências nacionais com as respectivas tradições históricas, políticas, sociais e económicas.

Governança, Competitividade e Internacionalização constitui o tema genérico do terceiro bloco de textos. No primeiro artigo desta série, “Pecunia non olet – Quali conoscenze e quali politiche per contrastare la criminalità mafiosa in una Europa mediterranea globalizzata?”, Giovanni Bechelloni questiona por que é que a Sociologia abandonou a comunicação e descurou o fenómeno da criminalidade mafiosa. Contrariando a ideia de que tais fenómenos seriam coisa do passado, que os mafiosi seriam homens incultos, o autor sustenta que a máfia está hoje representada por indivíduos aparentemente respeitáveis, em várias áreas e designadamente nos mercados financeiros.

O segundo texto, “Paraísos fiscais – novos desafios e ameaças”, de Ana Margarida Raposo Ferreira, conceptualiza os paraísos fiscais (centros financeiros offshore) como um fenómeno social não regulado, gerador de ineficácia económica e de desigualdades sociais, ao mesmo tempo que constitui ameaça ao Estado de Direito, na medida em que representa actividades de evasão fiscal, beneficiando de sigilo bancário e de tributação nula ou baixa.

No texto seguinte, “A UEFA e o governo do futebol. Promoção do modelo desportivo europeu ou da (des)capitalização e desigualdade entre países?”, de Daniel Seabra, focaliza-se no modo como a UEFA gere a massa de capital obtida das receitas e de outras fontes. Evocando a legislação da União Europeia e outros documentos oficiais, assinala dificuldades na conciliação do Direito Comunitário com a gestão do futebol e elucida sobre a permeabilidade da UEFA a influências que favorecem os clubes dos países mais ricos.

No quarto artigo desta série, “Recent trends in wages and collective bargaining in Portugal”, João Dias e Maria da Conceição Cerdeira contextualizam a situação de baixo crescimento económico em Portugal, argumentando que tal adversidade não impediu a existência de um diálogo social forte, saldando-se inclusivamente num número significativo de acordos colectivos e em aumento do salário real.

O artigo seguinte, de João Caetano e Nicolás Lori, trata “O Conhecimento da lei como dimensão estratégica do país”, abordando a necessidade do conhecimento da Lei como imperativo da criação de riqueza e da gestão dos processos democráticos.

As Parcerias Publico Privadas (PPP) constituem o tema do sexto artigo. No texto “Os Novos arranjos institucionais na governança pública: o caso das Parcerias Público-Privadas. Estudo comparativo entre o Sul e o Norte da Europa”, Sandra Firmino começa por discutir o conceito de PPP, assinalando a heterogeneidade de modalidades e comparando a respectiva expressão em Portugal, Espanha, Reino Unido e Holanda.

O sétimo artigo, de Nicólas Lori e João Caetano, incide sobre “O contexto da competitividade internacional para as universidades portuguesas”. Os autores abordam o conceito de universidades de topo em contexto internacional e tecem considerações sobre os factores susceptíveis de melhorar o posicionamento nos rankings, para o que convocam experiência pessoal de um dos autores.

Finalmente, Ines Elezović e Jasminka Buljan Culej, no texto “Introducing the National Informatical System of applying to Universities in Croatia”, referenciam a recente reforma na educação ocorrida na Croácia, em particular no que diz respeito às condições de transição do ensino secundário para o ensino superior. O essencial do artigo consiste na apresentação de um sistema de gestão da informação, considerado um caso de sucesso, que a partir da mesma plataforma informática permite acompanhar todo o processo de candidatura às universidades.

O quarto bloco de textos reúne reflexões sobre Desafios do Estado Social e Sistemas de Saúde na Europa do Sul. As contribuições aqui incluídas iniciam-se com o texto de Carla Valadas, “New challenges to a changing labour market and welfare state. The Portuguese recent experience”. Considerando as transformações ocorridas no mercado de trabalho em Portugal e contextualizando-as face aos constrangimentos internacionais e a opções de política interna, a autora discute as implicações para o Estado social, argumentando que este apresenta sérias vulnerabilidades na resposta a problemas emergentes, designadamente, agravamento das condições de vida, risco de pobreza e exclusão social.

O texto seguinte, “South-European Pension Systems: Challenges and Reform Prospect”, é assinado por Leandro N. Carrera, Marina Angelaki e Daniel Carolo. Os autores problematizam a relação entre a crise económica nos países da Europa do Sul e a pressão para reestruturar o sistema de pensões nesses países. Estudam as mudanças suscitadas pela crise em Espanha, Itália, Portugal e Grécia e o impacto produzido sobre o sistema de pensões. Da análise efectuada concluem que algumas mudanças positivas na sustentabilidade financeira podem ter sido conseguidas em prejuízo da eficácia dos benefícios.

O terceiro texto, de Maria Engrácia Cardim, Luís Mota e Luísa Pereira, questiona: “Será tudo da crise, ou devemos repensar o Estado social? A emergência de novos paradigmas”. A abordagem proposta centra-se nas políticas sociais em contexto de crise económica. Entre outros aspectos, os autores desenvolvem argumentação a respeito dos desafios que se colocam à governança das políticas públicas, incluindo o envolvimento de stakeholders da sociedade civil, a promoção de culturas de responsabilidade social e da public accountability.

O texto seguinte, “Estado e cidadão: o papel social de desempregado em Portugal”, de Isabel Marçano, traça um breve panorama histórico do desemprego e seu significado, desde os finais do séc. XIX até à actualidade. Operacionaliza o conceito de desempregado e apresenta uma tipologia, com quatro perfis de desemprego: distanciado, negociado, adaptado/interiorizado e reivindicado, sendo os dois primeiros de transição e os dois últimos de exclusão.

No quarto texto deste grupo, “Considerations on the efficacy and collective legitimacy of the welfare system in the South of Italy”, Fiorella Vinci apresenta uma breve reflexão sobre a eficiência económica e a legitimação colectiva do Estado de bem-estar no Sul da Itália. A autora partilha a tese da interdependência e articulação entre políticas sociais e económicas, o que, por sua vez, conduz à imprescindibilidade de coordenação nos diversos níveis de governo.

Os dois textos finais incluídos nesta área temática abordam alguns aspectos dos sistemas de Saúde na Europa do Sul. A iniciar, Tiago Correia, no artigo “New Public Management in the Portuguese health sector: a comprehensive reading” trata do modo como em Portugal se têm aplicado as orientações internacionais da Nova Gestão Pública ao domínio da saúde. A análise recai sobre cinco dimensões: descentralização de competências, financiamento e accountability, racionalização da despesa, desregulação do mercado de trabalho e competição e diferenciação internas no sector hospitalar.

Seguidamente, Mauro Serapioni e Dolores Sesma abordam “A participação dos cidadãos nos sistemas de saúde dos países da Europa do Sul: Portugal, Itália e Espanha. Resultados preliminares de um estudo comparativo”. Começam por caracterizar os sistemas de saúde dos três países em causa, incorrendo depois na exploração da relação entre sistemas de saúde e associações de cidadãos para daí extrair as linhas de força sobre participação, cidadania e governance.

O quinto e último conjunto de textos engloba duas contribuições sobre Sociabilidades e Vizinhanças Urbanas. Graça Índias Cordeiro, Ioana Florea e Tiago Trigueiro, no artigo “Participative social work and urban change: two case studies in Lisbon and Bucharest” descrevem e comparam duas iniciativas de intervenção social em contextos urbanos marginalizados. Além de analisarem os processos e resultados das duas iniciativas (Alta de Lisboa e Kommunitas), os autores mostram as potencialidades da investigação-acção, designadamente na criação de estruturas sociais de mediação em contexto periférico.

A contribuição de Patrícia Pereira e Jordi Nofre, “Rebuilding urban morphology: new centralities and urban inequalities in Southern European cities”, focaliza-se na transformação social e produtiva de áreas urbanas outrora marginalizadas. Estudando dois casos (Parque das Nações, em Lisboa e Fira-2, em Barcelona), os autores argumentam que o urbanismo neo-liberal, e as estratégias de competitividade que lhe estão associadas, conduz a cidades social e culturalmente “higienizadas”, decorrendo de deslocações espaciais das classes trabalhadoras e sua substituição pelas classes médias.

Autores: Ana Romão, Dalila Cerejo, Helena Serra, Luís Baptista e Manuel Carlos Silva