N.º 28 - abril 2022
Vanessa Carvalho da Silva
FUNÇÕES: Concetualização, Análise formal, Aquisição de financiamento, Investigação, Metodologia, Visualização,
Redação do rascunho original, Redação — revisão e edição
AFILIAÇÃO: Iscte — Instituto Universitário de Lisboa, CIES — Centro de Investigação e Estudos de Sociologia.
Avenida das Forças Armadas, Gabinete 2N17D, 1649-026 Lisboa, Portugal
E-mail: vpcsa@iscte-iul.pt | ORCID: https://orcid.org/0000-0001-5031-2801
Patrícia Ávila
FUNÇÕES: Análise formal, Metodologia, Recursos, Supervisão, Validação, Redação — revisão e edição
AFILIAÇÃO: Iscte — Instituto Universitário de Lisboa, Departamento de Métodos de Pesquisa Social, CIES —
Centro de Investigação e Estudos de Sociologia. Avenida das Forças Armadas, Gabinete D3.10, 1649-026 Lisboa, Portugal
E-mail: patricia.avila@iscte-iul.pt | ORCID: https://orcid.org/0000-0003-2456-8197
Resumo: Nas sociedades atuais, marcadas pela centralidade do conhecimento, da informação e da educação, uma parte da população adulta tem ainda níveis de escolaridade muito baixos e persiste arredada das dinâmicas da chamada Aprendizagem ao Longo da Vida (ALV). Tratando-se de um segmento da população que, do ponto de vista da análise sociológica e da incidência das políticas públicas, tem sido deixado para trás e sobre o qual pouco se conhece, pretende-se contribuir para o conhecimento e visibilidade do fenómeno dos indivíduos pouco escolarizados que, apesar das iniciativas implementadas no âmbito da educação e formação de adultos e da aprendizagem ao longo da vida, permaneceram nas margens da sociedade educativa. Na ausência de estudos extensivos especificamente centrados neste segmento da população, foi mobilizada a edição de 2016 do Inquérito à Educação e Formação de Adultos para tentar mapear o fenómeno em Portugal. Com uma presença transversal na sociedade portuguesa é um grupo de dimensão expressiva, cuja diversidade se captou através da identificação de diferentes perfis. Os mesmos dados permitiram ainda retratar as práticas e atitudes, perante a ALV, da população com baixa escolaridade em Portugal.
Palavras-chave: aprendizagem ao longo da vida, adultos pouco escolarizados, abordagem extensiva, inquérito à educação e formação de adultos.
Abstract: In contemporary societies, marked by the centrality of knowledge, information, and education, part of the adult population still has very low educational levels hence remaining outside the dynamics of the so-called Lifelong Learning (LLL). This is a segment of the population that, from the point of view of sociological analysis and the incidence of public policies, has been left behind and know little about. Therefore, we intend to contribute to the knowledge and visibility of the phenomenon of poorly educated individuals who, despite the initiatives implemented in the field of adult education and training and LLL, remained on the margins of the educational society. In the absence of extensive studies specifically focused on this segment of the population, we resort on the 2016 edition of the Adult Education Survey to try mapping the phenomenon in Portugal. With a transversal presence in Portuguese society, it is a group of significant size, whose diversity was captured through the identification of different profiles. The same data also allowed portraying the practices and attitudes towards LLL among the population with low educational attainment in Portugal.
Keywords: lifelong learning; low educated adults; extensive approach; adult education survey.
Introdução
Este artigo surge no âmbito de um projeto de investigação intitulado “Ficar de Fora: Contextos, Processos, Disposições e Reflexividades dos adultos poucos escolarizados que não retomaram a educação formal”, do qual resulta este recorte quantitativo. Sendo uma pesquisa metodologicamente orientada por uma abordagem de métodos mistos, a componente quantitativa, sobre a qual incide este artigo visa retratar os adultos pouco escolarizados ainda não abrangidos por processos formais de educação e formação de adultos, retirando da invisibilidade um segmento da população sobre o qual o conhecimento prévio é reduzido, alumiando, em concomitância, o trabalho qualitativo do mesmo projeto (Carvalho da Silva, no prelo).
A pertinência desta investigação resulta da confirmação da existência, nas sociedades contemporâneas, de um imperativo de uma aprendizagem que deve acontecer ao longo da vida dos indivíduos, sustentada pela ideia de celeridade da transformação social e, consequentemente, da necessidade de uma adaptação constante e igualmente ágil. Apesar de não ser uma novidade (M. G. Alves, 2010; Field, 2000; Sanz Fernández, 2006;), a ideia de se aprender ao longo da vida trouxe uma redefinição da perceção coletiva sobre a educação e a aprendizagem. A aprendizagem passaria a ter de extravasar o período da educação inicial e a própria ideia de aprender, passando agora a estar associada a toda a experiência humana, impulsionada pelo reconhecimento partilhado de que o indivíduo não nasce pronto, ou seja, que é inacabado (Cortella, 2011).
Com a participação em atividades de Aprendizagem ao Longo da Vida (ALV) no centro das preocupações políticas (e dos discursos) das últimas décadas (Jarvis, 2001, 2004; Carvalho da Silva, 2022, entre outros), foram sendo construídos instrumentos de medida, entre os quais se destaca o Inquérito à Educação e Formação de Adultos (IEFA), com o objetivo de conhecer a participação neste tipo de atividades. Trata-se de uma operação estatística comunitária e quinquenal — que já conta com 3 edições — enquadrada pelo Regulamento (UE) n.º 1175/2014, de 30 de outubro, que aplica o Regulamento (CE) n.º 452/2008 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de abril de 2008 (INE [Instituto Nacional de Estatística], 2016b), relativo à produção e ao desenvolvimento de estatísticas sobre educação e aprendizagem ao longo da vida. Dos resultados deste inquérito foi-se atestando a emergência de novas desigualdades, e a reafirmação das já existentes, entre países e dentro de cada país, essencialmente no que concerne ao envolvimento — ou afastamento — de segmentos específicos da população em atividades de educação e aprendizagem, para além da educação inicial (INE, 2013, 2017; N. Alves, 2020; Ávila, 2020; Ávila & Aníbal, 2019).
A participação tem sido desigual, sobretudo, entre grupos socioeconómicos distintos, evidenciando-se uma menor participação nos casos dos indivíduos menos escolarizados. As diferenças na participação têm sido explicadas através da identificação de obstáculos (externos: custo, horários, oferta, impactos residuais e parco reconhecimento; e internos: disposições negativas sobre a aprendizagem) que poderão estar na génese deste envolvimento desigual dos indivíduos em atividades de educação e aprendizagem, ao mesmo tempo que se tem exigido ao Estado Providência um papel ativo no esbatimento desses obstáculos (Lavrijsen & Nicaise, 2017).
Em Portugal, o défice de qualificações da população tem contribuído para uma relação relutante com a ALV, corroborando as desigualdades entre os mais velhos e os mais novos e, especialmente, entre os menos escolarizados e os mais escolarizados. Por este motivo, reveste-se de relevância um conhecimento sociológico mais aprofundado dos adultos pouco escolarizados que, em Portugal, têm ficado à margem da designada sociedade educativa (Field, 2006; Jarvis, 2001, 2007).
A partir da análise secundária dos dados da edição de 2016 do Inquérito à Educação e Formação de Adultos foi possível conhecer a distribuição destes indivíduos pelas várias regiões do território nacional, por grupos profissionais, pela condição perante o trabalho, por sexo, por escalões etários e por níveis de escolaridade. Confirmando a heterogeneidade e transversalidade deste segmento da população, foram identificados perfis que facilitaram a delimitação no terreno dos adultos pouco escolarizados que não retomaram a educação formal. A identificação destes perfis permitiu ainda apreender, extensivamente, as singularidades das práticas e das atitudes relativamente à participação em atividades de aprendizagem ao longo da vida de cada um dos perfis existentes na população portuguesa pouco escolarizada que tem ficado de fora da sociedade aprendente.
Enquadramento teórico
Quem tem ficado para trás na era da aprendizagem ao longo da vida
Segundo John Field, a compreensão dos fenómenos relacionados com a ALV deverá acarretar, para além da análise sobre os objetivos, políticas públicas, medidas e programas, o imperativo de uma questão que ainda carece de resposta: quem tem sido deixado (ou quem tem ficado) para trás? (Field, 2006).
No contexto das sociedades atuais, de generalização da educação e de centralidade do conhecimento e da informação, a que acresce uma mudança intensa, rápida e generalizada — “intrageracional” (Enguita, 2007, p. 33) —, que impele os indivíduos a aprenderem ativamente e a estarem envolvidos em diversos momentos de educação e formação, a ALV foi-se transformando num direito e, sobretudo, num dever (Cavaco, 2013). Associada a esta ideia de universalidade da aprendizagem e das qualificações certificadas e não certificadas, em que tudo conta para melhorar o currículo, as sociedades têm requerido dos indivíduos aptidões de empreendedorismo e gestão do seu próprio manancial de competências enquanto recursos económicos e funcionais. São exigidas, para isso, novas etapas de aprendizagem, em concomitância ou alternadas com o trabalho. Esta nova aprendizagem (para atualização, reciclagem, formação contínua, permanente ou recorrente) pode passar pelo retorno à educação formal,[1] ou pela participação em atividades de aprendizagem não formal e informal — intencional ou espontânea (Enguita, 2007). A responsabilização individual dos sujeitos transformou-se num requisito em todas as decisões, desde as mais simples (p. ex. o que vestir ou calçar; o que comprar para comer), até às mais complexas (p. ex. que área de estudos escolher? Que profissão ter no futuro? Por que abordagem terapêutica optar perante uma doença oncológica?). A reflexividade da vida social moderna passou a resultar de uma reforma e exame constantes das práticas sociais, através da informação a que têm acesso (Giddens, 2002).
Perante uma sociedade em que o conceito de mudança já não é suficiente para retratar as sucessivas transformações de todas as dimensões da experiência humana (Beck, 2017; Enguita, 2007), e de acordo com alguns autores (Canário, 2000; Cavaco, 2013; Guimarães, 2012), o imperativo da ALV e a premissa da imposição de uma responsabilização individual, suportada pela ideia de uma construção, pelos próprios adultos, dos seus destinos, tem estado na base de um agravamento das desigualdades sociais, por colocar os adultos menos escolarizados em situações desfavoráveis, abandonados e responsáveis pela sua própria desgraça e insucesso (Cavaco, 2013; Guimarães, 2012). Note-se que estamos perante adultos a quem se atribuem dificuldades em aceder e gerir a informação e em interiorizar a necessidade de serem auto gestores da sua vida e das suas próprias aprendizagens, pelo que as ofertas não serão suficientes, por si só, para gerarem a procura e a sua participação (Cavaco, 2013). Desta forma, e resistindo ao discurso meritocrático sobre a (não) participação, ancorado nas lógicas da responsabilização, contemplando, ao invés, uma relação entre a agência dos indivíduos, as instituições educativas e os governos reguladores nos Estados Providência (N. Alves, 2020; Boeren et al., 2012), esta falta de envolvimento pode estar menos dependente da autodeterminação e da vontade individual, resultando, em concomitância, de políticas educativas, das suas medidas e programas.
Os conceitos e princípios da ALV foram discorrendo de textos desenvolvidos a partir dos anos 70, por entidades consideradas de referência no campo da educação: UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura) e OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico). Responsáveis pela reestruturação da conceção sobre a educação, estes textos contribuíram para um reconhecimento generalizado de três propriedades: i) acontece ao longo da vida e diz respeito a todo o tipo de aprendizagens (certificadas e não certificadas, intencionais e espontâneas); ii) decorre em múltiplos contextos da vida; iii) e foca-se nos processos de aprendizagem, ou seja, nos indivíduos, transcendendo os limites impostos pela educação (Desjardins et al., 2006). Para um conjunto alargado de países europeus, o ideal da ALV, ou de uma sociedade aprendente, tornou-se no argumento necessário para uma renovação dos sistemas educativos e formativos, respondendo, sobretudo, aos desafios do crescimento económico (Field, 2000). Depois de resistir na sombra da recessão económica (anos 70 e 80) (Field, 2000), na década de 1990, a ALV retorna ao centro das prioridades políticas a ocidente, como é possível atestar nos textos da OCDE (1996), da UNESCO (1996) e do Group of Eight (1999). Este retorno aos “palcos” foi justificado pela premência de as sociedades europeias responderem às exigências e às oportunidades da globalização, do desenvolvimento da ciência e das tecnologias de informação (Field, 2000). Perante a necessidade de fomentar um sentido de cidadania europeia, a inclusão social e a competitividade dos países europeus, a ALV apresentava-se como a melhor via estratégica para a sua concretização (Comissão Europeia [CE],1994).
Segundo vários autores, a retoma de um debate em torno de uma aprendizagem para lá da educação inicial resultou, sobretudo, de preocupações económicas, que tenderam muitas vezes a reduzir a ALV a uma missão profissionalizante, o que esteve na origem das inúmeras críticas que foram surgindo por parte das chamadas abordagens humanistas sobre a educação (Canário, 2013; Cavaco, 2009; Field, 2000; Guimarães, 2012; Lima, 2005). Estes debates em torno da transição de uma educação permanente dos anos 70 (que entendia a educação de adultos como projeto de transformação social), para uma aprendizagem ao longo da vida nos anos 90 (cujo enfoque seria a adaptação social, à luz de uma ideologia neoliberal e individualista), tinham na sua base uma crítica dirigida, sobretudo, à influência da União Europeia e da crise económica, na adoção de um modelo de políticas educativas orientado por uma lógica mercantilizante (Aníbal, 2014; Barros, 2011). De acordo com os defensores da educação permanente, esta mercantilização havia tornado o aprendente num consumidor e o educador (bem como a instituição educativa) num fornecedor, fazendo da educação uma “coisa” transacionável (Biesta, 2006). Contudo, outras vozes foram defendendo que o enfoque na aprendizagem não negligenciava a educação, uma vez que alargava o seu campo de ação, incluindo outros elementos e atores. De acordo com esta premissa, a, aprendizagem (ao longo da vida) não deveria ser entendida como uma oposição ou antítese aos ideais da educação permanente, mas antes como a ligação entre a educação e a complexidade das sociedades atuais (Milana et al., 2017).
Neste debate, importa ter presente que as mudanças ocorridas nas últimas décadas transformaram o conhecimento e a informação em recursos relevantes na organização das sociedades atuais (Costa et al., 2007; Stehr, 2007), onde aprender ao longo da vida emerge como uma necessidade inexorável de integração e sobrevivência no mundo social contemporâneo. Nos textos e relatórios mais recentes (Comissão Europeia [CE], 2019; OCDE, 2019, 2020; UNESCO, 2019, 2020), a ALV tem-se apresentando sob a égide de múltiplos usos e propósitos, assumindo-se como uma oportunidade de todos e para todos (UNESCO, 2019). Aprender ao longo da vida continua a surgir como uma chave para a gestão dos múltiplos desafios que a humanidade enfrenta, preparando as pessoas para lidar com a mudança e para construir um futuro. Esta aprendizagem visa a igualdade de oportunidades e a inclusão social, traduzindo-se numa ferramenta imprescindível na reconversão, ou progressão profissional em situações de crise e de desemprego, melhorando a empregabilidade (OCDE, 2019, 2020; UNESCO, 2020) e promovendo a cidadania e a coesão social. O entendimento partilhado sobre a ALV, nestes documentos, não a dissocia de uma missão de concretização de um potencial e crescimento pessoal, ou do exercício de uma cidadania ativa, informada e responsável, nem mesmo da defesa da sustentabilidade ambiental (CE, 2019; Council Recommendation of 19 December 2016, 2016; UNESCO, 2020). A ALV consubstancia-se num instrumento de preservação democrática contra a desinformação e o populismo, ao mesmo tempo que fomenta a saúde pública e o bem-estar. Contempla-se, nesta visão, uma multiplicidade de ofertas, de atores e de públicos da aprendizagem, educação e formação de adultos (CE, 2019).
De acordo com a perspetiva teórica defendida por Ávila, somente uma conceção integradora destas duas visões político filosóficas (educação permanente e aprendizagem ao longo da vida) poderá, efetivamente, contribuir para uma análise sociológica das dinâmicas inerentes à aprendizagem, educação e formação de adultos (Ávila, 2008). Assim, considera-se que as críticas que denunciam a ALV como uma expressão que ilustra uma rutura de paradigma e uma erosão dos ideais da educação permanente (M. G. Alves et al, 2010; Canário, 2013; Cavaco, 2009; Guimarães, 2012; Lima, 2005), embora reveladoras das orientações dos decisores políticos, não são suficientes para captar a complexidade das dinâmicas em curso (Aníbal, 2014). Importa, por exemplo, conhecer o desenho concreto das políticas implementadas (a quem se dirigem, como são financiadas, que modalidades são implementadas, que metodologias são mobilizadas e que competências são desenvolvidas) e os seus impactos, para lá dos discursos e das suas bases ideológicas, captando os seus efeitos à escala individual e percebendo as várias dimensões da vida afetadas, ou não, pelas experiências de participação em atividades de ALV — p. ex. um maior investimento na aprendizagem, educação e formação de adultos e os seus impactos no desenvolvimento dos quatro pilares da educação da UNESCO (2011): i) aprender a conhecer (a aprender); ii) aprender a fazer; iii) aprender a conviver e iv) aprender a ser, e na concretização de um envolvimento continuado e alargado em dinâmicas de aprendizagem.
No caso específico de Portugal, a educação e formação de adultos, e dessa forma a própria ALV, tem sido marcada pela falta de consenso político e por estar demasiado dependente de fundos europeus, o que tem resultado numa forte intermitência das políticas públicas (Araújo, 2015; Canário, 2013; Capucha, 2018; Carvalho da Silva, 2022; Guimarães, 2012).
A ambiguidade em torno da ALV também se faz sentir nas diferentes perceções no que concerne aos seus desideratos e sentidos (M. G. Alves, 2010; Canário, 2000; Sanz Fernández, 2006). Por exemplo, para aqueles que tiveram uma experiência educativa bem-sucedida, e que se reconhecem como aprendentes capazes, continuar a aprender traduz-se numa experiência enriquecedora, como algo com sentido, positivo e emancipatório e sem obstáculos disposicionais. Desta forma, a participação em atividades de aprendizagem confere-lhes sentido de liberdade e de controlo sobre as suas próprias vidas e sobre a sociedade. Porém, para outros, a pressão para aprender ao longo da vida reforça sentimentos de falhanço pessoal e pode apresentar-se como uma forma de controlo social e autoritarismo moral, como algo que se sentem obrigados a fazer para conseguirem sobreviver em situações limite — como o acesso ao subsídio de desemprego —, e como uma dimensão da vida social na qual não se reveem e que é para os outros (Field, 2006). Para todos aqueles que são excluídos destes processos, ou que escolhem não participar neles, a generalização do discurso sobre a ALV pode ter um efeito potenciador do seu isolamento social.
Estas diferentes perceções sobre a ALV não podem ser dissociadas de algo para o qual a investigação neste domínio tem vindo, de forma sistemática a alertar. A participação em atividades de ALV depende fortemente da educação de base e das competências previamente desenvolvidas (ou não). Com efeito, a educação formal[2] tem sido identificada como aquela que permite a preparação dos indivíduos, desde logo através da aquisição de competências de leitura e de outras ferramentas necessárias para transformar outras aprendizagens em novas competências, motivando e permitindo o seu envolvimento em atividades propiciadoras de novas aprendizagens (Ávila, 2008; Benavente, 1996). A educação formal constitui também, muitas vezes, uma barreira imposta pelas próprias instituições de educação e formação. Veja-se, a título ilustrativo, o caso de Portugal, em que o acesso a modalidades formais e não formais de aprendizagem, principalmente aquelas que constam do Catálogo Nacional de Qualificações,[3] estão dependentes do nível de escolaridade detido pelos indivíduos, o que diminui a sua liberdade de escolha relativamente ao seu percurso formativo, limitando a sua capacidade de reconversão ou de progressão profissional e, consequentemente, a sua participação neste tipo de atividades de aprendizagem (Carvalho da Silva, 2019).
Os resultados dos Inquéritos à Educação e Formação de Adultos, deram ainda conta de que os adultos menos escolarizados têm sido os que menos participam em modalidades de ALV, enquanto os mais escolarizados têm sido aqueles que mais se envolvem noutras aprendizagens (N. Alves, 2020; Ávila, 2020; Ávila & Aníbal, 2019; INE, 2013, 2017; OCDE, 2003; Riddell et al., 2012; Robert 2012). Em linha com essas conclusões, existe um elemento comum nos discursos das três entidades de referência em torno da ALV: OCDE, UNESCO e Comissão Europeia (Carvalho da Silva, 2022) — relacionado, exatamente, com esta preocupação sobre estes outros que já são considerados os perdedores (pobres) do conhecimento nas sociedades atuais. Efetivamente, a escolaridade e as qualificações tornaram-se dimensões decisivas das desigualdades de recursos e oportunidades nas sociedades estruturadas pelo conhecimento (Costa, 2012). Outros estudos recentes têm, também, confirmado não só a relação entre a capacitação social e o nível de escolaridade, bem como o papel da dimensão educativa na mobilidade social dos indivíduos (Martins et al., 2016). A apreensão relativamente a este fenómeno tem sido tanto maior, quanto mais se tem compreendido o tamanho do fosso entre os que têm e os que não têm recursos educativos e se atesta a presença do designado efeito Mateus (Ávila, 2008; Bertaux, 1977/1979; Merton, 1968). O efeito Mateus, conceito que se inspira na parábola do Evangelho Segundo São Mateus, refere-se a esta ideia de cumulatividade, isto é, de que quanto mais ricos em conhecimento forem os indivíduos, mais provável será a expansão das suas aprendizagens e competências, deixando/ficando para trás os que menos têm (baixos níveis de escolaridade, baixos rendimentos, precaridade laboral, etc.). O impacto deste efeito extravasa os indivíduos e o seu subgrupo, fazendo-se sentir intra e inter países, uma vez que o espaço para aqueles que são reconhecidamente pouco qualificados é praticamente inexistente nas economias do conhecimento, e todos os países que têm lugar nesta corrida ao desenvolvimento querem ficar bem posicionados.
A análise da relação entre a educação formal e as restantes formas de aprender (não formal e informal) tem reforçado a conclusão de que são necessárias competências para gerar competências (Desjardins et al., 2006; Lavrijsen & Nicaise, 2017). Esta afirmação encontra eco no reconhecimento da literacia e do nível de escolaridade enquanto competências-chave para o envolvimento noutras situações de aprendizagem, sobretudo aquelas que se baseiam na escrita (Ávila, 2007; Benavente, 1996; Costa, 2003). Porém, e de acordo com os estudos e programas de avaliação de literacia e das competências dos adultos, é possível identificar diferentes níveis de literacia e/ou de participação em atividades de ALV em indivíduos com os mesmos níveis de escolaridade. Assim sendo, torna-se necessário compreender o impacto da qualidade da educação e, sobretudo, dos contextos de mobilização das competências adquiridas (p. ex. a condição perante o trabalho; a profissão e a função desempenhada; as práticas de escrita, leitura e de cálculo na atividade profissional e no quotidiano, ou mesmo a simplicidade das tarefas realizadas no dia-a-dia), lembrando que, para além da importância dos níveis de educação formal, os contextos também podem ser desqualificantes (Benavente, 1996; OCDE, 2016). A inexistência de contextos que mobilizem competências operatórias, consideradas essenciais para aprender ao longo da vida, poderá mesmo resultar na sua diminuição ou desaparecimento.
A menor participação dos menos escolarizados configura um fenómeno multidimensional, por ter na sua génese mais do que uma hipótese explicativa, desde uma preparação débil, por parte da educação formal para o envolvimento noutras aprendizagens, passando por más experiências pedagógicas, falta de autoestima e outras disposições negativas resultantes de cicatrizes aprendentes (Carvalho da Silva, 2019). A não participação pode, inclusivamente, advir da incapacidade destes indivíduos reconhecerem a necessidade de participar para se movimentarem nas sociedades contemporâneas (Desjardins et al., 2006; Lavrijsen & Nicaise, 2017). Assim, e tal como enunciado por vários autores, considera-se fundamental ter presente que são múltiplas as barreiras que contribuem para que os adultos menos escolarizados permaneçam distantes das dinâmicas da ALV, importando evitar visões simplistas ou unidimensionais (N. Alves, 2020; Cross, 1981; UNESCO, 2019).
Neste artigo, procura-se aprofundar o conhecimento sobre o perfil social dos adultos pouco escolarizados que não retomaram a educação formal. Pretende-se mostrar que estamos perante um segmento da população heterógeno e que essa diversidade sociológica se reflete em múltiplas dimensões, nomeadamente nas dinâmicas de participação em atividades de ALV e, consequentemente, no modo como terão de ser equacionadas as formas de ultrapassar as barreiras que ainda os mantém afastados.
Metodologia
Não existindo dados publicados que incidiam especificamente sobre a população pouco escolarizada que não melhorou as suas qualificações através de processos formais de educação e formação de adultos, ou seja, sobre aqueles que, tendo qualificações escolares reduzidas, têm permanecido à margem da sociedade educativa, na sua dimensão formal, a pesquisa foi realizada através da análise de dados secundários da edição de 2016 do Inquérito à Educação e Formação de Adultos (INE, 2016a).
O acesso aos microdados da edição de 2016 do IEFA ocorreu ao abrigo do Protocolo entre o Instituto Nacional de Estatística (INE), a Fundação para Ciência e tecnologia (FCT) e o Gabinete de Planeamento, Estratégia, Avaliação e Relações Internacionais do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior assinado, a 23 de dezembro de 2008, que permite o acesso a dados recolhidos pelo INE no âmbito de atividades de investigação.
Trata-se de uma operação estatística quinquenal, realizada em Portugal desde 2007 e conta com 3 edições: 2007, 2011 e 2016. Como inquérito europeu, os instrumentos são concebidos pelo Eurostat e cabe ao INE a sua adaptação, desenho da amostra e recolha de informação no território nacional. Em 2016, a população alvo foi a população residente em Portugal (Continente e Ilhas) com idades entre os 18 e os 69 anos, a viver em alojamentos familiares de residência principal. A amostra é probabilística, estratificada e multietápica e abrangeu 14 211 inquiridos.
Respeitando as fontes utilizadas, os conceitos de aprendizagem formal, não formal e informal utilizados ao longo desta investigação são os do IEFA (INE, 2016b), que por sua vez mobiliza a proposta conceptual do Eurostat.[4]
Os desafios de trabalhar com dados secundários, estiveram presentes na análise dos microdados. Embora muito rico, com um conjunto alargado de variáveis, e apoiado numa amostra representativa da população, o IEFA está desenhado para captar sobretudo a participação, ou não, da população em atividades de ALV no ano anterior ao ano em que decorre a sua aplicação, não existindo nenhum indicador que responda diretamente às necessidades da presente pesquisa, ou seja, que identifique os adultos pouco escolarizados que, após a saída da escola, não retomaram processos de educação formal em adultos.
Ainda assim, foi possível, a partir das variáveis existentes e mobilizando um conjunto articulado de operações, delimitar esses inquiridos.[5] Em primeiro lugar, foram selecionados todos aqueles que detinham uma escolaridade igual ou inferior ao 3º ciclo (inclusive os que tivessem nenhum nível de escolaridade completo e que à data do inquérito não estivessem a estudar). Posteriormente, e uma vez que se pretendia identificar os inquiridos que, tendo baixa escolaridade, não foram abrangidos por percursos de educação formal em adultos, foi necessário saber a idade de conclusão do grau de escolaridade mais elevado alcançado. Com base nas variáveis disponíveis na base de dados — idade, à data do inquérito, e ano de conclusão do nível de escolaridade mais elevado completo — construiu-se uma nova variável, a idade de conclusão da educação formal. Finalmente, relacionando essa variável com o grau de escolaridade, foram selecionados os indivíduos com uma escolaridade inferior ou igual ao 3º ciclo do ensino básico cuja conclusão do nível de escolaridade mais elevado completo ocorreu numa idade igual ou inferior aos 18 anos. Desta forma, ficaram delimitados os inquiridos que integram o segmento da população alvo da presente investigação.
Seguiu-se a análise estatística dos dados, com a qual se procurou responder aos objetivos da pesquisa. Num primeiro momento, apurou-se o peso no conjunto da população deste grupo de inquiridos e, com base em ferramentas de análise estatística descritiva univariada, foram analisadas as suas principais características sociodemográficas.
O mapeamento e caracterização sociográfica levados a cabo permitiram perceber a forte heterogeneidade social que atravessa este segmento da população e conferiu a necessidade e a pertinência de aprofundar a identificação dos vários perfis sociais da população portuguesa pouco escolarizada que tem permanecido à margem das sociedades aprendentes.
O exercício metodológico exigido para lidar com objetos de configuração complexa transporta na sua base o desiderato de traduzir essa complexidade, mobilizando abordagens multidimensionais e relacionais. Perante um objeto cuja compreensão depende de múltiplos fatores, importa desenvolver abordagens estruturais que permitam captar a sua multidimensionalidade. Assim, e sem que se perca a individualidade de cada fator, procura-se apreender a sua interdependência e as configurações que surgem da sua interação, valorizando, dessa forma, a análise do sistema de relações que ganha forma entre eles (Carvalho, 2008/2017).
Com esse objetivo, recorreu-se à Análise de Correspondências Múltiplas (ACM) (Carvalho, 2008/2017), que permitiu apreender as caraterísticas de multidimensionalidade do objeto de estudo, através de uma abordagem estrutural, cuja operacionalização se suportou em indicadores qualitativos. Para o efeito e procurando-se realizar uma análise relacional sobre os múltiplos atributos que caracterizam estes indivíduos, foi selecionado um conjunto de indicadores de caracterização sociográfica, como o sexo, a idade, a escolaridade, a condição perante o trabalho e o grupo profissional.
A representação gráfica dos dados, sobre este fenómeno complexo, num plano bidimensional[6] que exibe as diferentes combinações das suas propriedades, a ACM permitiu captar as relações estatísticas entre as múltiplas variáveis e categorias em análise, permitindo conhecer a estrutura dessas relações (Carvalho, 2008/2017). Foi assim possível identificar os primeiros contornos dos diferentes perfis sociais presentes neste segmento da população portuguesa.
Os perfis identificados na ACM foram, posteriormente, delimitados empiricamente com o recurso à Análise de Clusters. Assim, a partir das coordenadas dos objetos (os indivíduos em análise) nas duas primeiras dimensões da ACM aplicou-se a um método de agrupamento não hierárquico (K-Means clusters) para assegurar a sua classificação em diferentes grupos, ou clusters, refletindo as configurações emergentes na ACM. A delimitação destes perfis tipo permitiu aprofundar a leitura da complexidade e diversidade do objeto estudo.
Resultados
A caracterização da população portuguesa que tem ficado fora da educação formal, em Portugal
Por não exercerem todos a mesma atividade profissional, o que inviabilizou a sua redutibilidade a uma categoria de mundo social, estes adultos pouco escolarizados que não retomaram a educação formal podem ser entendidos enquanto categoria de situação social (Bertaux, 2020), o que permite a pressuposição de que estes partilhem os mesmos constrangimentos, tensões e a mesma pressão para lógicas de ação que respondam à sua situação (Carvalho da Silva, no prelo).
Criadas as condições para mapear este fenómeno a partir do IEFA (INE, 2016a) atestou-se que o segmento dos adultos pouco escolarizados que não retomaram a educação formal representa 42% dos inquiridos. Quer isso dizer que, em Portugal, perto de metade da população tem escolaridade muito reduzida (inferior à atual escolaridade obrigatória) e não frequentou, com sucesso, percursos formais de educação na idade adulta. Analisando as principais características destes indivíduos, apercebemo-nos de que têm uma presença muito expressiva transversal no território nacional (Tabela 1), que tende a acompanhar de algum modo a distribuição demográfica no país, ressaltando-se a presença no Norte (40,2%), seguida da zona centro com 21,3% e Área Metropolitana de Lisboa (21%). Juntas, estas áreas concentram cerca de 82% do total deste segmento.
Tabela 1 Distribuição geográfica dos adultos pouco escolarizados que não retomaram a educação formal, em Portugal (%)
Fonte: Inquérito à Educação e Formação de Adultos (INE, 2016a). Cálculos próprios.
Quando dirigimos o nosso olhar para outras características deste grupo, é possível voltar a atestar a sua transversalidade. Atendendo à condição perante o trabalho (Tabela 2), observa-se a presença nas várias categorias em análise, embora com maior incidência nos indivíduos empregados, com perto de 60%, e nos inativos, com aproximadamente 30%. Perto de 15% encontravam-se, à data da inquirição, desempregados.
Tabela 2 Condição perante o trabalho dos adultos pouco escolarizados que não retomaram a educação formal, em Portugal (%)
Fonte: Inquérito à Educação e Formação de Adultos (INE, 2016a). Cálculos próprios
Debruçando-nos sobre os seus níveis de escolaridade (Tabela 3), é possível observar que a maioria detém entre o 2º e o 3º ciclo do ensino básico (53%), apesar de que, sozinho, o nível com maior expressão é o do 1º ciclo do ensino básico (41, 3%).
Tabela 3 Nível de escolaridade dos adultos pouco escolarizados que não retomaram a educação formal, em Portugal (%)
Fonte: Inquérito à Educação e Formação de Adultos (INE, 2016a). Cálculos próprios.
Considerando a sua distribuição por outros indicadores como o sexo, ou os grupos etários, e apesar das diferentes incidências, foi possível atestar, uma vez mais uma transversalidade multidimensional da população adulta pouco escolarizada que tem ficado de fora da educação formal. Na distribuição por sexo, as diferenças são muito ténues, com os homens a representarem cerca de 52%. No entanto, relativamente à distribuição por escalões etários (Tabela 4), a maior concentração deste segmento compreende os indivíduos com idades entre os 45 e os 69 anos (67%), sendo parca a presença nos escalões mais jovens com apenas 4%, entre os 18 e os 24 anos.
Tabela 4 Escalões etários dos adultos pouco escolarizados que não retomaram a educação formal, em Portugal (%)
Fonte: Inquérito à Educação e Formação de Adultos (INE, 2016a). Cálculos próprios.
Esta distribuição etária corrobora outros autores (Capucha, 2018) que alertam para a existência de um hiato geracional relativamente à escolaridade em Portugal, tendo de um lado os mais velhos e menos escolarizados e do outro os mais novos e mais escolarizados. A este hiato acresce a vulnerabilidade que discorre do défice de qualificações, com o seu impacto e relevância, já atestados, num menor envolvimento posterior com a ALV (Capucha, 2018). A missão da educação e formação de adultos seria esbater essa diferença, focando as suas iniciativas nos adultos mais velhos e menos qualificados. O que estes dados revelam é que as diferentes iniciativas que resultaram das políticas públicas nacionais de educação e formação de adultos, ainda demasiado dependentes de fundos europeus e, por isso, extremamente voláteis e descontínuas na sua forma e duração, não têm conseguido alcançar o público estratégico, demonstrando, por isso, a sua ineficácia e falhando na sua missão (Carvalho da Silva, 2022; CE, 2019).
Complementando a análise realizada, seguindo pistas deixadas por análises sobre a existência de uma correlação entre a escolaridade dos indivíduos e os níveis de escolaridade dos seus pais (INE, 2013, 2017), procurou-se concretizar um olhar extensivo sobre as origens sociais deste segmento. Assim, através das variáveis: escolaridade do pai e escolaridade da mãe, observou-se que os adultos pouco escolarizados que têm permanecido à margem da educação formal, são filhos de pais com níveis muito baixos de escolaridade (entre o Nenhum grau e o 1º ciclo do ensino básico), as mães de 50% dos inquiridos são analfabetas (Nenhum grau de escolaridade) e no caso dos pais, 50% possui apenas o 1º ciclo do ensino básico. Note-se que nenhum destes indivíduos tem pais com uma escolaridade para lá do ensino secundário, o que parece confirmar que estamos perante efeitos de reprodução e produção antroponómica fortemente enraizados nas famílias e com os quais tem sido difícil romper, apesar da melhoria evidente das qualificações escolares das gerações mais novas. (Bertaux, 1977/1979; Bourdieu & Passeron, 1970). Mesmo nos casos em que foi alcançada a escolaridade obrigatória vigente na época em que estes indivíduos frequentaram a escola, tal não parece ter sido suficiente para assegurar a sua participação posterior em atividades de ALV e, em particular, para retomar processos de educação formal que lhes permitam acompanhar as crescentes exigências neste domínio.
Estes resultados tornam evidente um caminho de desvantagem cumulativa, que tem sido demonstrado por vários autores, em que os menos favorecidos abandonam a escola precocemente, não regressam como adultos à educação formal e são remunerados com os salários mais baixos (Elman & O’Rand, 2004). Efetivamente, o que daqui se pode deduzir é a dependência da aprendizagem ao longo da vida do capital escolar das famílias e dos contextos e das redes de sociabilidade dos indivíduos. Assim sendo, atestar a presença de níveis tão baixos, ou inexistentes, de escolaridade na família de origem, deverá ajudar-nos a compreender um dos motivos que poderá estar na génese do não retorno à educação formal e que poderá ainda significar a existência de uma relação débil com as restantes atividades e formas de aprendizagem (não formal e informal). Ao mesmo tempo, deixa clara a necessidade de uma intervenção mais bem-sucedida no que concerne ao retorno destes “pais” menos escolarizados a ofertas de educação e aprendizagem de adultos, tornando possível romper com uma espécie de círculo vicioso da reprodução.
O perfil de emprego em Portugal revela uma evolução no sentido da terciarização e digitalização da atividade, que se traduz num aumento da percentagem da população empregada nas áreas dos serviços (69%), entre os quais se destacam as atividades de comércio e reparação de veículos (20%), saúde e serviços de apoio social (14,2%) e educação (12,5%) (INE, 2020a). A maioria da população ativa portuguesa detém uma escolaridade entre o “sem nível de escolaridade” e o “nível básico de escolaridade” (aproximadamente 50% — NUTSII), cerca de 40% tem como atividade principal uma profissão no setor dos serviços (pessoais, proteção e segurança e vendedores) e em atividades intelectuais e científicas (INE, 2021). No que concerne à população portuguesa pouco escolarizada que não retomou a educação formal, aparentemente alinhada com o cenário nacional, apesar de uma distribuição que corrobora a sua transversalidade, este segmento faz-se representar, sobretudo, por profissionais dos trabalhadores da indústria, construção e artífices (24,3%), dos serviços (21,5%) e por trabalhadores não qualificados (16,5%). Juntos, estes setores empregam 62,5% dos indivíduos ativos (e a trabalhar) pouco escolarizados que não aumentaram o seu nível de escolaridade depois de sair da escola (educação inicial) (Tabela 5).
Tabela 5 Distribuição por grupos profissionais dos adultos pouco escolarizados que não retomaram a educação formal, em Portugal (%)
Fonte: Inquérito à Educação e Formação de Adultos (INE, 2016a). Cálculos próprios.
No caso dos serviços, importa refletir sobre a diversidade de atividades abrangidas por esta categoria, evitando enviesamentos de análise, ao lembrar que intrinsecamente compreendem atividades com graus de complexidade e de qualificações muito distintos. Numa tentativa de contornar estas limitações explicativas a propósito do que se deverá entender, estatisticamente, por terciarização das sociedades, Freire (2001) propôs um desdobramento do terciário em duas outras categorias: uma primeira categoria composta por um terciário mais tradicional e pouco qualificado, intitulado comércio e serviços, e uma outra categoria cuja prestação de serviços abrange profissionais mais qualificados, intitulada de profissional (citado em Almeida, 2007). Assim, e tendo em conta a divisão proposta por Freire, assumindo que a distribuição deste segmento pelo grupo profissional dos serviços consistirá em trabalhadores da primeira categoria, podemos concluir que cerca de 80% deste segmento se inscreve em trabalhos menos ou pouco qualificados, distribuídos da seguinte forma: 21,5% trabalhadores dos serviços pessoais, de proteção e segurança e vendedores; 24,3% de trabalhadores qualificados da industria construção e artífices; 16,5% de trabalhadores não qualificados; 14,9% operadores de máquinas e trabalhadores da montagem e 5,4% agricultores e trabalhadores qualificados da agricultura, pesca.
A reflexão sobre a posição dos indivíduos que têm ficado à margem da sociedade educativa, sobretudo na compreensão da extensão dos impactos desse afastamento em relação à educação formal, deverá também considerar os dados do mais recente Inquérito sobre a Identificação das Necessidades de Qualificações nas Empresas (INE, 2020b), no qual se regista uma dificuldade de recrutamento, por parte das empresas, motivada pela falta de formação adequada dos trabalhadores (57,3%). Esta fragilidade em sociedades marcadas, cada vez mais, pela centralidade da educação e da qualificação, é igualmente sublinhada por outros dos resultados desse inquérito (INE, 2020b), que advieram da auscultação sobre as profissões em que as empresas preveem reduzir o número de trabalhadores. Os grupos profissionais mencionados foram, exatamente os trabalhadores dos serviços pessoais, de proteção e segurança e vendedores, bem como o pessoal administrativo e os trabalhadores não qualificados, numa redução prevista de 30,9%, 19% e 15,9%, respetivamente. Contudo, de acordo com os mesmos resultados, a empregabilidade para os grupos dos agricultores e dos trabalhadores qualificados da agricultura, da pesca, etc. vai-se mantendo (INE, 2020b), o que poderá contribuir para de algum modo explicar a persistência de adultos ativos pouco escolarizados em Portugal. O mercado de trabalho, apesar do rumo traçado à terciarização, continua a absorver os menos escolarizados. Atualmente, em Portugal, são duas as áreas que referem sentir necessidade deste tipo de trabalhadores: a agricultura (apanha da fruta e de produtos agrícolas) e a construção (canalizadores, eletricistas, operários qualificados) (INE, 2020a).
Não obstante, a diversidade de atividades que desempenham na sociedade portuguesa, confirma a presença transversal dos adultos pouco escolarizados que não retomaram a educação formal. Pode, assim, concluir-se que o atavismo da subqualificação marca presença em praticamente todos os grupos profissionais, independentemente da dissemelhança do peso da sua expressão.
Perfis da população portuguesa pouco escolarizada à margem da sociedade educativa
Os resultados já apresentados potenciaram a pertinência analítica da procura de identificação dos principais perfis deste segmento da população, considerando, em simultâneo, os vários indicadores até aqui analisados separadamente.
Foram analisadas as duas primeiras dimensões, e a projeção das categorias das variáveis em análise num plano bidimensional (Figura 1) tornou evidentes as suas associações privilegiadas. A primeira dimensão (eixo horizontal) opõe os menos escolarizados (sem grau ou até ao Básico 1), as mulheres, os mais velhos e os inativos, aos relativamente mais escolarizados, aos homens, aos mais jovens e aos ativos. A 2ª dimensão (eixo vertical) opera sobretudo uma distinção entre estas últimas categorias (as que têm quantificações positivas na dimensão 1), emergindo, por um lado, associações entre modalidades que podemos chamar de “intermédias” (em termos de idade e de escolaridade, por exemplo) e grupos profissionais mais ligados ao operariado e pouco qualificados, e, por outro lado, associações entre a escolaridade mais elevada, as categorias etárias mais jovens e a inserção em atividades profissionais ligadas aos serviços.
Figura 1 Perfis da população portuguesa à margem da sociedade educativa
Fonte: Inquérito à Educação e Formação de Adultos (INE, 2016a). Cálculos próprios.
A leitura integrada das duas dimensões da ACM permite, então, delimitar três perfis sociais cujas principais características se enunciam em seguida sumariamente.
Um perfil composto sobretudo por indivíduos entre os 55 e os 69 anos, sem grau de escolaridade ou escolaridade muito reduzida (B1), sem atividade profissional, reformados e domésticas (aqui designados outros inativos).
Outro perfil que associa os escalões etários intermédios (em especial entre os 45 e 65 anos), ao 2º ciclo do ensino básico, aos empregados e inseridos nos seguintes grupos profissionais — GP: representantes do poder legislativo e de órgãos executivos, dirigentes, diretores e gestores executivos (GP1); agricultores e trabalhadores qualificados da agricultura, da pesca e da floresta (GP6); trabalhadores qualificados da indústria, construção e artífices (GP7); operadores de instalações e máquinas e trabalhadores da montagem (GP8); e trabalhadores não qualificados (GP9).
Um último perfil constituído por indivíduos com idades entre os 18 e os 34 anos, com o 3º ciclo do ensino básico e que se inscrevem tendencialmente nos seguintes grupos profissionais — GP: técnicos e profissões de nível intermédio (GP3); pessoal administrativo (GP4); e trabalhadores de serviços pessoais, proteção e segurança e vendedores (GP5). De notar que a categoria “desempregado” se aproxima deste último grupo (por referência à sua coordenada na dimensão 2) e também do primeiro grupo (por referência à sua coordenada na dimensão 1).
O resultado de uma primeira tentativa, meramente descritiva, de classificar cada perfil atendendo às suas características mais expressivas, é o seguinte:
Perfil 1 — Mais velhos e inativos
Perfil 2 — Ativos e empregados
Perfil 3 — Jovens entre o emprego e o desemprego
A partir dos resultados da ACM foi realizada uma análise Clusters que permitiu classificar os inquiridos em cada um dos três perfis atrás descritos. Este procedimento permitiu conhecer o seu peso relativo na amostra e ainda precisar a relação com as variáveis mobilizadas. Note-se que, no plano apresentado, os três grupos resultantes da análise de clusters (CL1, CL2 e CL3) estão projetados enquanto variáveis suplementares para facilitar a sua correspondência com os perfis analisados.
Entre os inquiridos pouco escolarizados que não retomaram processos formais de educação e formação de adultos, o grupo mais expressivo corresponde ao perfil 2, com um peso de 40%. Segue-se, com valores muito próximos — 37% — o perfil 1, e com um peso um pouco mais baixo o perfil 3 — 23%.
O cruzamento de cada perfil com as variáveis sociográficas utilizadas na sua identificação demostra que, na distribuição pela escolaridade, o perfil dos mais velhos e inativos, é constituído por indivíduos que têm ou nenhum grau de escolaridade (10, 8 %) ou o 1º ciclo do ensino básico (cerca de 70%). Já o perfil dos ativos e empregados distribui-se entre o 1º ciclo (40%) e o 2º ciclo (42%). Dos indivíduos do perfil dos jovens entre o emprego e o desemprego, 84% detêm o 3º ciclo do ensino básico.
Relativamente ao sexo, enquanto no perfil dos adultos mais velhos e inativos, predominam as mulheres (60%), no perfil dos ativos e empregados é o sexo masculino que prevalece (63%). No perfil dos mais jovens a distribuição por sexo é equilibrada (feminino — 50,1%; masculino — 49,9%). Não deixa de ser interessante perceber o impacto de medidas como a escolaridade obrigatória, a própria evolução dos direitos da mulher e a luta pela igualdade género, acompanhados pelo princípio de universalização do acesso à educação, que surge espelhado, de alguma forma, na distribuição destes perfis por sexo, desvelando aquilo que se pode considerar uma mudança de rumo e até mesmo um esbatimento das desigualdades de género ao longo do tempo. Esta ideia das mulheres a aprender e os homens a trabalhar, que foi figurando em alguns estudos (Hayes & Flannery, 2000; McGivney, 2004) poderá ajudar a compreender a contra tendência observada entre o perfil dos mais velhos e inativos e o dos ativos e empregados, mas parece já não encontrar eco na compreensão do fenómeno observado no caso do perfil dos mais jovens, uma vez que estes valores se aproximam, podendo traduzir uma mudança rumo a uma maior igualdade de género entre os mais novos. No que diz respeito, por exemplo, à participação em modalidades de educação (e formação) formal, de acordo com a análise de Natália Alves (2020), a variável sexo surge como aquela que tende a ser menos discriminatória.
Quanto à condição perante o trabalho, o perfil dos mais velhos e inativos compreende 79,6% de inativos e 19,5% de desempregados, enquanto o perfil dos ativos e empregados é 100% composto por empregados. No perfil dos mais jovens, apesar da maior fatia estar empregada (67,5%), 30% são indivíduos desempregados. No que concerne aos grupos profissionais, a sua distribuição é a seguinte: no perfil dos ativos e empregados, 30% integram o grupo dos trabalhadores qualificados da indústria, construção e artífices, 19% são trabalhadores não qualificados, 17% pertencem ao grupo dos operadores de instalações e máquinas e trabalhadores da montagem, 7,5% estão no grupo dos representantes do poder legislativo e de órgãos executivos, dirigentes, diretores e gestores executivos; e 7,4% são do grupo dos agricultores e trabalhadores qualificados da agricultura, da pesca e da floresta. Relativamente ao perfil dos jovens entre o emprego e o desemprego, 27,5% são trabalhadores de serviços pessoais, proteção e segurança e vendedores, cerca de 10% pertencem ao grupo dos técnicos e profissões de nível intermédio e 7% integram o grupo do pessoal administrativo. No entanto, note-se que 33,5% destes indivíduos não têm profissão, o que poderá representar o grupo daqueles que estão em fase de desemprego, ou que ainda não integraram o mercado de trabalho (designados por NEET), sublinhando esta ideia de se tratar de um grupo em suspenso, indefinido, quer relativamente à educação formal e à ALV, quer em relação ao emprego. Neste campo importa ainda lembrar o impacto do desemprego oculto — “oculto porque, normalmente, não aparece nas estatísticas, porque se mascara de trabalho clandestino, em part-time e temporário” (Pais, 2001, p. 25). Esta indefinição tem surgido retratada em estudos sobre a juventude e a transição para a vida adulta como os de Vieira et al. (2020), Ferreira et al. (2017) e N. A. Alves et al. (2011), entre outros, que foram dando conta das condições de imprevisibilidade a que os jovens estão sujeitos no dia-a-dia, consequência de uma integração laboral muitas vezes de duração imprevisível, de baixos níveis remuneratórios e de contextos cada vez mais incertos e instáveis.
Participar ou não participar, essa é a questão: a relação com a ALV dos três perfis de adultos pouco escolarizados que têm ficado à margem da sociedade educativa, em Portugal
As práticas e atitudes dos três perfis identificados relativamente à ALV foram analisadas através da informação presente no IEFA (INE, 2016a) sobre a participação em atividades de ALV. Reportando-se a atividades realizadas no ano anterior à aplicação do inquérito por questionário, o IEFA tem como principal objetivo dar conta das taxas de participação em atividades de aprendizagem formal, não formal e informal. Embora a delimitação da amostra nos tenha levado a circunscrever a análise aos inquiridos que não concluíram nenhum processo de educação formal em adultos, procurou-se, ainda assim, perceber, se teriam participado nesse tipo de atividades no ano de referência do IEFA. Quando analisamos a participação em atividades de educação não formal, observamos, como seria de esperar, taxas de não participação muitíssimo elevadas, as quais vão decrescendo regularmente do perfil 1 até ao perfil 3: entre os mais velhos e inativos situa-se nos 91,8% e no perfil dos mais jovens, entre o emprego e o desemprego é de 59,9%. Assim, se a maioria dos indivíduos deste segmento não participou em modalidades de educação não formal nos últimos 12 meses anteriores à aplicação do IEFA, devem ser assinaladas diferenças importantes consoante o seu perfil social, com os mais jovens e mais escolarizados a serem os mais abrangidos por esse tipo de atividades e podendo representar tentativas de retorno sem sucesso ou ainda não concluídas.
Tentando perceber amiúde, para lá da participação, as atitudes sobre o envolvimento ou distanciamento de cada um destes perfis com ALV, atestou-se que foram poucos os que não tendo participado, queriam ter participado em atividades de aprendizagem (na ordem dos 20% em cada perfil, com um ligeiro aumento, 23% no caso do perfil dos jovens e mais escolarizados). Foram ainda menos os que participaram e quiseram participar mais, havendo novamente uma acentuada discrepância entre perfis, perante as quais urge refletir: apenas 3% no perfil dos mais velhos e menos escolarizados, 15% no perfil dos adultos em idade ativa e pouco escolarizados, e 23% no perfil dos jovens e mais escolarizados. A reflexão a este respeito terá necessariamente de convocar o conhecido efeito Mateus, recorrentemente mencionado no quadro da análise das práticas de ALV. Mesmo quando estamos em presença de baixos níveis de escolaridade, o número de anos de formação marca presença na relação (desigual) com a ALV, voltando a penalizar tanto mais os indivíduos quanto mais baixos forem os seus níveis de escolaridade. Se nos detivermos sobre a não participação sem intenção de participar, encontramos uma maioria expressiva de 71% no perfil dos mais velhos e inativos, seguida de cerca de 45% no perfil ativos e empregados, e decrescendo para 33% no caso do perfil dos jovens entre o emprego e o desemprego. Ao mesmo tempo, dos poucos que participaram, foram os perfis dos jovens e dos ativos e empregados que mais se destacaram, apresentando a maior percentagem dos que não quiseram participar mais (10,4% e 19,8% respetivamente).
Um outro dado relevante remete para o facto de a maioria dos adultos pouco escolarizados que não retomaram processos de educação formal não procurou informações sobre educação e formação nos últimos 12 meses que antecederam a aplicação do inquérito (95%, 92% e 77%, respetivamente). Estes resultados deverão consubstanciar as preocupações das políticas públicas de educação e formação de adultos, por serem indícios de lacunas na comunicação e na passagem desta ideia da ALV como valor fundamental, acrescido de um possível desajuste entre as ofertas e as suas modalidades e este público específico.
Aprendizagem não formal e impactos na vida profissional
Relativamente à participação dos adultos em atividades de aprendizagem não formal foi possível observar que, à luz do que foi apurado relativamente ao conjunto da população nacional, em que a participação em atividades de aprendizagem não formal (45,2%) se destacou positivamente da participação em atividades de educação formal (11,3%) (INE, 2017), também a participação dos sujeitos em análise confirmou esta tendência. Se a inexpressividade da participação na educação formal é expectável atendendo, sobretudo, às características do segmento em análise, os valores referentes à participação em atividades não formais de aprendizagem parecem desvelar a estreita relação entre este tipo de aprendizagens e as políticas de emprego (N. Alves, 2020). Senão, veja-se o aumento significativo dos valores da participação entre o perfil dos mais velhos e inativos (8,2%) e os restantes dois perfis: ativos e empregados (34,9%) e jovens entre o emprego e o desemprego (40,1%).
A participação em atividades de ALV (educação formal e aprendizagem não formal), também ela distinta entre os três perfis, reflete este envolvimento (ou a falta dele) em atividades formais e não formais de aprendizagem: 8,5% no perfil 1; 35,2% no perfil 2 e 43,7% no perfil 3. Os resultados corroboram o que outros estudos têm revelado (N. Alves, 2020; Ávila & Aníbal, 2019; Boeren, 2016; Desjardins et al., 2006) de que a participação diminuiu com a idade e perante níveis mais baixos de escolaridade e que, mesmo entre os pouco escolarizados, são os mais jovens e mais escolarizados que mais participam em atividades de ALV.
Retomando a participação em atividades de aprendizagem não formal, o IEFA (INE, 2016a) mediu o impacto da sua frequência através de diferentes indicadores, como por exemplo, se esta contribuiu para arranjar um trabalho, ou para aceder a um aumento, para ser promovido, ou para melhorar o desempenho ou ainda se permitiu assumir novas responsabilidades no trabalho. A análise dos resultados apurados deste impacto nos três perfis de adultos pouco escolarizados que não retomaram a educação formal (Tabela 6), permitiu observar uma ausência de impactos positivos na capacidade destes indivíduos conseguirem um emprego, e na possibilidade de melhorarem a sua condição laboral (ser promovido; ser aumentado).
Tabela 6 Impacto da frequência de atividades de aprendizagem não formal na vida profissional dos três
perfis da população pouco escolarizada que não retomou a educação formal, em Portugal (%)
Fonte: Inquérito à Educação e Formação de Adultos (INE, 2016a). Cálculos próprios.
Note-se que, apesar de maioritariamente inexpressivo o impacto da aprendizagem não formal melhora ligeiramente para os perfis de indivíduos ativos, tanto os mais jovens, como os outros, no que concerne à atribuição de novas responsabilidades no trabalho. O mesmo se verifica na melhoria do desempenho, que resulta da auto perceção destes indivíduos relativamente aos resultados da sua própria aprendizagem. Curiosamente, a posição dos indivíduos em relação aos impactos da aprendizagem não formal parece mudar ligeiramente quando o foco desse impacto são as atividades desenvolvidas, percecionando-se uma melhoria de desempenho, ou novas responsabilidades no trabalho. Sublinhe-se que, todavia, em todas as questões colocadas a este respeito o “não” é predominante em todos os perfis, destacando-se de forma mais acentuada nos mais velhos e inativos.
Apesar de a participação em atividades de aprendizagem não formal ser a modalidade que mais tem contribuído para o aumento da taxa global de participação dos adultos em atividades de ALV[7] (INE, 2017), parece existir ainda uma reduzida valorização destas aprendizagens por parte do mercado de trabalho e das empresas, o que pode constituir um obstáculo ao seu alargamento.
A participação em atividades informais de aprendizagem
Um dos objetivos deste recorte também passou por compreender se é possível atestar, em cada um dos perfis, a presença do efeito Mateus por referência a outras atividades de aprendizagem ao longo da vida, não circunscritas à formalidade e não formalidade das ofertas. Tal como definidas no quadro do IEFA, consubstanciam-se em atividades de aprendizagem intencionais, mas são suportadas pela informalidade e são entendidas pela UNESCO (2019) como o núcleo da própria ALV. Efetivamente, as pessoas envolvem-se em múltiplos contextos ao longo do seu ciclo de vida, e apesar da importância já aqui referida do contexto profissional enquanto gatilho e incentivo para o eventual envolvimento em atividades contínuas de aprendizagem, também a casa, a família, a escola dos filhos, a comunidade e diversas práticas de lazer podem ser contextos de aprendizagem. Todos estes contextos podem, ou não, propiciar e requerer competências sendo por esta via motivadores de um envolvimento com outras formas de aprender.
Atendendo à natureza flexível da aprendizagem informal, e à sua invisibilidade, por se referir muitas vezes, por um lado, a aprendizagens não conscientes (acidentais, aleatórias) e por outro lado, depender de um reconhecimento sobre que a que tipo de atividades esta se pode referir quando é intencional, trata-se de um indicador subjetivo devendo ser questionada a forma como tem sido utilizado na recolha de dados estatísticos sobre a ALV (Aníbal, 2014). No IEFA (INE, 2016a), a participação dos adultos em atividades de aprendizagem informal foi captada através de um conjunto de atividades e de recursos (meios), como o envolvimento em visitas guiadas a museus, bibliotecas e locais históricos, os hábitos de leitura de livros ou revistas especializadas, a utilização de meios de comunicação, como a rádio ou a televisão, ou meios tecnológicos como tablets, computadores e smartphones, e as redes de proximidade como familiares, amigos ou colegas.
As respostas negativas imperaram entre os inquiridos de todos os perfis quando questionados se tinham ou não desenvolvido aprendizagens suportadas por visitas guiadas a museus, locais históricos ou naturais e visitas a bibliotecas (Tabela 7). Os valores mais elevados do “não” referem-se, exatamente, a formas informais de aprender que se aproximam de estruturas ou iniciativas assumidamente de caráter educativo, como é o caso das bibliotecas ou das vistas guiadas a museus. A visita a bibliotecas ou centros de aprendizagem (2,6%; 3,2% e 6,2%), configura-se mesmo como o tipo de aprendizagem informal em que menos se envolvem todos estes indivíduos. De facto, e tal como na participação da restante população portuguesa em atividades de ALV (Ávila & Aníbal, 2019), a taxa de participação em atividades informais de aprendizagem parece decrescer à medida em que aumenta o seu grau de formalização.
Tabela 7 A aprendizagem informal nos perfis dos adultos poucos escolarizados que não retomaram a
educação formal, em Portugal (%)
Fonte: Inquérito à Educação e Formação de Adultos (INE, 2016a). Cálculos próprios.
Ainda assim, noutras atividades de aprendizagem informal, como as que são suportadas por livros e revistas especializadas e as que decorrem da utilização de dispositivos tecnológicos, como o tablet, computador ou smartphone, as diferenças entre os perfis em análise são bastante salientes. Se entre o perfil dos mais velhos e inativos as atividades de aprendizagem apoiadas em dispositivos tecnológicos são declaradas por apenas 1/5 dos inquiridos, no caso do perfil dos jovens entre o emprego e o desemprego, os valores situam-se nos 75%. A aprendizagem através da leitura, também atesta esta desigualdade entre os três perfis, voltando a opor, sobretudo os mais velhos (24,7%) aos mais jovens (44,2%). No que concerne à leitura enquanto aprendizagem informal, e apesar de estudos recentes revelarem que se trata de uma prática nacional em decréscimo, principalmente, entre os mais jovens e mais qualificados, a mesma não deixa de estar fortemente associada à escolaridade (Lopes et al., 2021), e no caso dos adultos pouco escolarizados são, precisamente, os perfis dos indivíduos mais velhos e com níveis de escolaridade mais baixos aqueles que revelam uma menor adesão a essas práticas. Note-se que o interesse pela leitura tem sido associado ao interesse pela aprendizagem, e ao desenvolvimento de competências de literacia, e outras competências-chave da ALV (Ávila, 2008; Costa, 2003; Desjardins et al., 2016). Nos casos em que a literacia é limitada a possibilidade de os indivíduos desenvolverem outros processos de aprendizagem fica condicionada (Ávila & Aníbal, 2019), o que deixa estes adultos despreparados para lidar com os desafios da celeridade das transformações sociais em curso e ainda mais excluídos das dinâmicas da ALV.
O recurso a familiares, amigos e colegas parece aproximar os três perfis, para os mais velhos e inativos é o tipo de aprendizagem informal em que mais se envolvem, apesar de, ainda assim, quando comparados entre si, seja nos perfis dos mais jovens (72,3%) e dos ativos e empregados (65,4%) que encontramos os valores mais elevados de utilização destes contextos para aprender. Atendendo à diversidade de contextos a que nos remete (família, trabalho, amigos), fica por conhecer, por exemplo, o impacto das origens sociais destes indivíduos, das suas redes de socialibilidade (a escolaridade e outros indicadores sobre os amigos) e do tipo de contextos profissionais em que estes se movimentam (o tipo de qualificações e funções com as quais lidam no dia-a-dia). A ausência desta informação no IEFA (INE, 2016a) não nos permite atestar, por esta via, os riscos de uma reprodução (Bourdieu & Passeron, 1970) da mesma realidade social e, por isso, das mesmas fragilidades e de uma relação atávica de afastamento com a ALV.
Entre os perfis em análise, aquele que mais se destaca na mobilização das aprendizagens informais é o dos mais jovens entre o emprego e desemprego, ou seja, é o dos que sendo pouco escolarizados, por referência às exigências da sociedade atual, têm, ainda assim, uma escolaridade mais elevada do que a dos outros perfis. Esta maior mobilização é ainda mais visível nos dois últimos tipos de aprendizagem informal: tablet, computador ou smartphone (75%) e família, amigos ou colegas (72,3%).
Poderá concluir-se, assim, que, no caso da participação em atividades informais de aprendizagem dos menos escolarizados que não retomaram a educação formal, o efeito Mateus continua a marcar presença, uma vez que a idade e o nível de escolaridade, que ainda assim, conseguiram alcançar, condicionam os valores da sua participação (ou não) neste tipo de aprendizagens Estes resultados revelam, uma vez mais, que estamos em presença de indicadores cumulativos de vulnerabilidade na relação (desigual) com a ALV dos adultos pouco escolarizados que não retomaram a educação formal (N. Alves, 2020; Ávila & Aníbal, 2019 Desjardins et al., 2006).
Considerações finais
A persistência nas sociedades atuais de uma parte considerável da população adulta que, embora pouco escolarizada não retomou a educação formal, e apesar de constar das preocupações de alguns organismos europeus (Cedefop — European Centre for the Development of Vocational Training — e Eurydice Network) e nacionais (CNE — Conselho Nacional de Educação), não tem marcado presença na agenda académica. Sem conhecimento prévio sobre este segmento específico da população portuguesa, procurou-se mapear o fenómeno e caracterizar sociograficamente este grupo de adultos.
Trata-se de uma parte expressiva da população portuguesa, ou seja, não estamos perante um grupo minoritário ou em vias de extinção. Está espalhado pelo território nacional, apesar de, como seria de esperar, se atestar uma maior concentração em zonas de elevada densidade populacional. Embora conte com uma presença transversal em todas as faixas etárias, constitui-se, sobretudo, por adultos com idades compreendidas entre os 45 e os 69 anos. São adultos ativos e inativos, mas com maior destaque para os empregados, estando inseridos em todos os grupos profissionais. A sua transversalidade também se faz sentir nos níveis de escolaridade, que embora por delimitação do objeto de estudo sejam globalmente baixos (inferiores à atual escolaridade obrigatória), não deixam de estar distribuídos por vários patamares, desde os analfabetos ou com o primeiro ciclo (a categoria mais expressiva quantitativamente), até aos que concluíram o 3º ciclo.
Perante a confirmação de estarmos na presença de um subconjunto da população marcado por uma forte heterogeneidade social, justificou-se a identificação de perfis que ajudassem a tipificar os adultos menos escolarizados que não retomaram a educação formal. Identificaram-se três perfis distintos: mais velhos e inativos; ativos e empregados; jovens entre o emprego e o desemprego. A caracterização sociográfica de cada um destes perfis permitiu corroborar as suas singularidades reforçando as idiossincrasias de um segmento da população cuja diversidade urgia conhecer. O seu conhecimento deverá contribuir para o desenho de políticas públicas que consigam responder às necessidades e desafios específicos de cada um destes grupos, adequando as ofertas e as modalidades de educação e formação disponíveis. A diversidade encontrada, resumida nestes três perfis, permite-nos identificar vários níveis de desigualdades, entre eles, por exemplo a relação com a ALV. Medida através da participação nas suas diferentes formas de aprendizagem (formal, não formal e informal) a análise desta relação corroborou a presença do efeito Mateus, internamente a um grupo que é muitas vezes tratado como um todo homogéneo, uma vez que, entre os perfis identificados, são, uma vez mais, os mais velhos e os menos escolarizados que apresentam as taxas de participação mais baixas, ficando, desta forma, duplamente excluídos das dinâmicas de ALV. Quando olhamos para estes resultados, e para as desigualdades entre estes perfis, é possível concluir que, entre os adultos pouco escolarizados que não retomaram a educação formal, uns estão mais à margem do que outros na designada sociedade aprendente. O mapeamento, caracterização e a identificação destes perfis, permitem conhecer o fenómeno, dando conta da sua expressão quantitativa e da sua diversidade, mas ainda não nos deixa respostas. Será, por isso, importante complementar esta análise com incursões qualitativas,[8] aprofundando as dinâmicas, contextos, disposições e reflexividades destes adultos sobre a aprendizagem.
Na fase de entropia que experienciamos, mundialmente, como resultado da pandemia, acentuam-se as vulnerabilidades de um segmento da população que as tem vindo a acumular em diversas dimensões do social, da desinformação, ao desemprego, passando pela redução das oportunidades de trabalho (que resultam de uma supressão dos trabalhos sazonais que absorvem este tipo de mão-de-obra). A existência de baixos níveis de literacia, associados aos baixos níveis de escolaridade, refletem ainda outra dimensão de lacunas relativamente às competências de processamento quotidiano da informação escrita, comprometendo, consequentemente, a capacidade de resposta destes indivíduos perante as exigências das sociedades atuais. A cumulatividade das suas fragilidades faz-se, inclusivamente, sentir nas medidas de proteção social promovidas pelo Estado, por dependerem de uma correta interpretação das informações disponibilizadas e de uma operacionalização autónoma das plataformas digitais ao dispor dos cidadãos. Note-se que a digitalização dos serviços tem substituído as vias tradicionais de atendimento ao público, tendo conquistado ainda um maior relevo nesta fase pandémica, por garantirem uma relação asséptica e distante, entre outras coisas.
Apesar de se reconhecer o esforço feito nas duas últimas décadas em Portugal, na melhoria das qualificações dos menos escolarizados, nomeadamente através da Iniciativa Novas Oportunidades, que contribuiu para o atenuar das desigualdades neste domínio (Ávila & Aníbal, 2019) permanecem evidentes dificuldades em responder aos mais resistentes ao envolvimento com a ALV. O fim daquela iniciativa e a demora em retomar políticas públicas com escala, visibilidade e formato adequado, aumentou ainda mais a distância e a possibilidade de um retorno destes adultos à aprendizagem e à educação.
Perante a confirmação da heterogeneidade dos três perfis aqui retratados, torna-se evidente a necessidade de um ajuste das medidas de educação, formação e aprendizagem de adultos a eles dirigidas. Estas deveriam ser desenhadas quase em modo alfaiate, da base para o topo, para responder às inúmeras especificidades, fragilidades e necessidades de cada perfil. A ideia de uma categoria homogénea de adultos pouco escolarizados é errónea e poderá conduzir à tentação de se uniformizarem as ofertas e as medidas de ALV — como por exemplo, no caso das ofertas dirigidas a jovens e adultos — continuando a deixar de fora aqueles que nelas não se reveem. Assim sendo, mais do que uma questão de atavismo, ou de desinteresse, estaremos perante um problema crónico ao nível da implementação das políticas de educação e formação de adultos, que não têm conseguido assegurar modalidades que atendam ao perfil etário, profissional, económico e social destes públicos. Ao desafio da heterogeneidade de perfis dos (ainda não) públicos, não se poderá deixar de se acrescentar a própria amplitude do campo da ALV, que conta com um conjunto muito diverso de atores estratégicos, e que parece depender sobretudo da capacidade de mobilização de vários setores da sociedade (Field, 2000). Para esta mobilização, é fundamental um reconhecimento generalizado da importância de aprender ao longo da vida e em diferentes contextos, valorizando todas as aprendizagens. Esta valorização dependerá, por isso, de um reconhecimento por parte do conjunto da sociedade (Estado, instituições educativas, entidades formativas, organizações sociais e culturais, sociedade civil, empresas…), da importância de assegurar um leque alargado de ofertas de educação e aprendizagem (formais, não formais e informais) que respondam aos desafios das sociedades atuais e às acentuadas desigualdades nelas existentes.
Fazer retornar os menos escolarizados à ALV, também não se compagina com políticas públicas de educação e formação de adultos intermitentes, pelo que é necessário rever a dependência destas estruturas de fundos e programas de curto prazo, viabilizando a sua continuidade e consistência. Os pouco escolarizados deverão continuar a ser o foco das preocupações no âmbito das políticas dirigidas à promoção da educação, formação e aprendizagem de adultos no século XXI.
Agradecimentos
A primeira autora agradece à FCT pela bolsa de doutoramento concedida para a realização da sua investigação (Referência SFRH/BD/135682/2018).
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Data de submissão: 30/06/2021 | Data de aceitação: 05/04/2022
Notas
Por decisão pessoal, as autoras do texto escrevem segundo o novo acordo ortográfico.
[1]A educação formal consiste nas modalidades que constam do Quadro Nacional de Qualificações, definido pelo Sistema Nacional de Qualificações — Decreto-Lei n.º 396/2007 (2007) e alterado pelo Decreto-Lei n.º 14/2017 (2017).
[2]O conceito de educação formal, não formal e informal surge alinhado com a proposta de definição do Eurostat e do IEFA (INE, 2017, p. 1): “o conceito de aprendizagem ao longo da vida, compreende a participação em alguma atividade de educação formal — ministrada em instituições de educação, conducente a um nível de escolaridade — ou não formal — atividade organizada de formação, profissional ou outra, numa dada área de competências, mas que não equivale a um nível de escolaridade”.
[3]Para mais informações sobre o Catálogo Nacional de Qualificações consultar:https://catalogo.anqep.gov.pt/
[4]“Aprendizagem formal: educação ou formação ministradas em instituições de educação ou formação, em que a aprendizagem é organizada, avaliada e certificada sob a responsabilidade de profissionais qualificados. Constitui uma sucessão hierárquica de educação ou formação, na qual a conclusão de um dado nível permite a progressão para níveis superiores; Aprendizagem não formal: formação que decorre normalmente em estruturas institucionais, devendo conferir um certificado de frequência de curso. Esta certificação não é normalmente reconhecida, pelas autoridades nacionais, não permitindo a progressão na sucessão hierárquica de níveis de educação e formação; Aprendizagem informal: processo consciente e voluntário de aquisição de conhecimentos, competências e atitudes.” (INE, 2016b, p.112).
[5]A preparação dos dados e a análise estatística foi realizada com recurso ao software IBM-SPSS.
[6]Dimensão 1: inércia 0,539; alfa de Cronbach 0,786; Dimensão 2: inércia 0,293; alfa de Cronbach 0,396.
[7]No IEFA a participação em ALV incluí a participação em atividades de aprendizagem formal ou não formal, e a taxa de participação em atividades formais tem sido, ao longo das três edições deste inquérito, sempre muito reduzida.
[8]Esta auscultação do terreno foi concretizada na etapa qualitativa do projeto de investigação “Ficar de fora: Contextos, Processos, Disposições e Reflexividades dos adultos pouco escolarizados que não retomaram a educação formal”, através da realização de um conjunto de entrevistas de carácter biográfico.
Autores: Vanessa Carvalho da Silva e Patrícia Ávila