2025, n.º 37, e2025376
Mónica Guerra da Rocha
FUNÇÕES: Concetualização, Investigação, Metodologia, Visualização, Redação do rascunho original, Redação – revisão e edição
AFILIAÇÃO: Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra – FEUC, Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra.
Av. Dr. Dias da Silva, 165, Celas, 3004-512, Coimbra, Portugal
E-mail: mfmguerra@gmail.com | ORCID: https://orcid.org/0009-0006-4114-4096
Resumo: O conjunto de práticas cotidianas relacionadas com o ato de comer define territórios e sociabilidades, compondo paisagens e produzindo espaço-tempo social. Comer, além de uma ação culturalmente contextualizada, também é uma forma de habitar e produzir espacialidades no contexto urbano. Recentemente, o debate sobre comida tem-se aproximado do debate urbano, destacando que não há um comer des-territorializado. Neste texto explora-se o comer enquanto modo de habitar a cidade a partir da operacionalização do conceito de paisagens alimentares urbanas. O texto adota uma perspetiva interdisciplinar sobre a comida, recorrendo a uma reflexão teórica que parte do diálogo entre literatura acerca da produção do espaço e de autores que têm trabalhado o lugar da comida nas dinâmicas urbanas e sociais, principalmente a partir do conceito de Sitopia e de espaço social alimentar. Insere nas dimensões da produção do espaço-tempo social propostas por Lefebvre (espaço concebido, praticado, representacional) a análise sobre a relação entre comida e espaço, ilustrada por exemplos de diversas escalas e áreas disciplinares.
Defende-se que a paisagem alimentar urbana deve ser cada vez mais considerada nos debates sobre urbanidades, em diálogo com os estudos de comida, a partir de uma abordagem interdisciplinar.
Palavras-chave: paisagens alimentares urbanas, espaço social alimentar, comida e urbanidades, perspetiva interdisciplinar.
Abstract: The set of daily practices related to the act of eating defines territories and sociability, composing landscapes and producing social space-time. Eating, as well as being a culturally contextualised action, is also a way of inhabiting and producing spatialities in the urban context. Recently, the debate on food has moved closer to the urban debate, emphasising that eating is not de-territorialised. This text explores eating as a way of inhabiting the city through the operationalisation of the concept of urban foodscapes. The text adopts an interdisciplinary perspective on food, drawing on a theoretical reflection that draws on the dialogue between literature on the production of space and authors who have worked on the place of food in urban and social dynamics, mainly from the concept of Sitopia and social food space. It includes an analysis of the relationship between food and space in the dimensions of the production of social space-time proposed by Lefebvre (conceived, lived and representational space), illustrated by examples from different scales and disciplinary areas.
It is argued that the urban foodscape should be increasingly considered in debates on urbanities, in dialogue with food studies, from an interdisciplinary approach.
Keywords: foodscapes, social foodspace, food and urbanities, interdisciplinarity perspective.
Introdução[1]
Both food and cities are so fundamental to our everyday lives that they are almost too big to see. Yet if you put them together, a remarkable relationship emerges — one so powerful and obvious that it makes you wonder how on earth you could have missed it. Every day we inhabit spaces food has made. [Cidades e comida são tão centrais nas nossas vidas cotidianas que chegam a ser grandes demais para serem vistas. No entanto, se você as colocar juntas, surge uma relação notável — tão poderosa e óbvia que faz você se perguntar com que diabos você poderia ter perdido isso. Todos os dias habitamos espaços que a comida fez.] (Steel, 2013, Intro., para. 3)
Ao denunciar a obviedade da relação que nossas cidades e a comida têm entre si, Carolyn Steel tem iluminado um território de investigação negligenciado no estudo das urbanidades. O pensamento e planeamento urbanos tem se debruçado bastante sobre setores como mobilidade, habitação, economia local, políticas culturais, educação, saúde, desigualdade e segregação espaciais, infraestrutura de saneamento, e mais recentemente de sustentabilidade ambiental e resiliência urbana. No entanto, cidades são “não apenas de cimento e de tijolos” (Steel, 2013, Intro., para. 1), mas de pessoas, de seres que possuem corpos, de sujeitos que, invariavelmente, se alimentam. Cidades são feitas de comida, pessoas se organizam na cidade e interagem com a cidade mediadas pela comida, em todas as cidades, todos os dias, e de formar muito distintas.
Com este texto pretende-se trazer o argumento teórico de que comida produz urbanidade, e que a interação entre sujeitos, comida e o território compõe paisagens e qualifica a prática e o imaginário que os sujeitos têm sobre a cidade — urbaniza a relação com o território. Apresenta-se uma reflexão com base em revisão de literatura, centrada na definição de paisagens alimentares e da elaboração conceitual Lefebvriana das dimensões da produção do espaço (Lefebvre, 1991), ilustrada a partir de exemplos de nexos comida-sujeitos-territórios. Conclui-se acerca da necessidade de um debate contemporâneo sobre nossas cidades que inclua de forma definitiva o olhar sobre a comida enquanto mediadora da relação entre sujeitos e territórios.
Comida e urbanidades: uma aproximação e contextualização teórica
By cooking meals and building shelters, we have created camps, farms, villages and eventually cities. By working out how to feed ourselves, we have found our place in the world. [Ao cozinhar refeições e ao construir abrigos, criamos acampamentos, fazendas, vilas e eventualmente cidades. Ao descobrir como nos alimentar, encontramos nosso lugar no mundo.] (Steel, 2020, p. 89)
É no ato de alimentar-se que “el hombre social, la fisiología y lo imaginario, están estrecha y misteriosamente mesclados” [o homem social, a fisiologia e o imaginário, estão misturados de forma estreita e misteriosa] (Fischler, 1995, p. 14), num processo de atravessamento do mundo natural (o alimento) para o corpo biológico, a partir de uma coreografia mediada por um conjunto de significados sociais e culturais, condicionada por tempos e geografias específicas e organizada em estruturas e conceções materiais e organizacionais do mundo. Comer implica um conjunto de relações estabelecidas em um sistema, desde a produção ao descarte final, passando pelo processamento, distribuição e acesso ao alimento, e que atravessa diversas dimensões — ambientais; económicas, sociais e de saúde — que são absolutamente conectadas entre si. Todas as vezes que comemos, esse gesto implica a mobilização de diversos sistemas, constituindo-se enquanto fato social total (Mauss & Lévi-Strauss, 2003), materializado num gesto cotidiano e universalmente compartilhado.
Essa cadeia exige um conjunto complexo de insumos (ingredientes, mão-de-obra, recursos naturais e técnicos, entre outros), produz uma série de impactos (sociais, ambientais, económicos, políticos) e acontece de forma espacializada (onde se come, onde se produz comida, onde se distribui, por onde ela se desloca, onde se descarta, onde se conhece e pensa sobre comida). A componente espacial dos sistemas alimentares designa-se mais comumente como “ambiente alimentar” (uma designação entre outras possíveis, frequentemente utilizada em documentos chave sobre sistemas alimentares e no desenho de políticas públicas alimentares orientadas para a saúde pública). O ambiente alimentar afeta tanto as cadeias de suprimento, quanto o comportamento alimentar e as dietas de forma geral. O acesso ao alimento, a sua disponibilidade, a informação existente acerca dos alimentos, as condições políticas garantidoras do direito à alimentação são exemplos, entre outros, de elementos presentes em um ambiente alimentar (High Level Panel of Experts on Food Security and Nutrition [HLPE], 2020), e tem sido cada vez mais reconhecida a importância de intervir nos ambientes alimentares com objetivo de promover sistemas alimentares que sejam mais saudáveis e sustentáveis (Bodor et al., 2010; Castro Junior, 2018) e de investigar a experiência vivida dos sujeitos nesses ambientes com vista a informar o desenvolvimento de políticas mais eficazes nessa promoção (Neve et al., 2021).
Comida e cidades: dois sistemas em crise
Para falar de comida e cidades é importante referir alguns dos desafios que ambos os sistemas (alimentares e urbanos) atravessam. Relatórios recentes do Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas (Intergovernamental Panel on Climate Change — IPCC) apontam que os sistemas alimentares são responsáveis por mais de 30% de todas as emissões de gases do efeito de estufa do planeta (Shukla et al., 2019), e por 70% de toda a perda de biodiversidade que experimentamos na atualidade (Benton et al., 2021). Esse sistema alimentar, que polui e que se uniformiza, não foi ainda capaz de resolver o enorme desafio social da fome — segundo a FAO (Food and Agriculture Organization of the United Nations), dados de 2022, 9,8% das pessoas passam fome em todo o mundo o que representa mais de 800 milhões de indivíduos (FAO et al., 2022). A partir dos desafios contemporâneos e dos debates emergentes acerca dos sistemas alimentares, o conceito de segurança alimentar e nutricional foi recentemente atualizado tendo sido acrescentado a importância da agência dos sujeitos e a sustentabilidade do sistema aos componentes consolidados de disponibilidade, acesso, utilização e estabilidade dos alimentos (HLPE, 2020). Esse novo marco teórico vem muito alinhado com debates crescentes acerca da necessidade de promover cadeias de produção e consumo alternativas e de fortalecer a diversidade dos sistemas alimentares, ao passo que coloca luz sobre a importância das práticas dos indivíduos e suas possibilidades de decisão na garantia de acesso a uma alimentação saudável e sustentável.
Se por um lado, nossos sistemas alimentares estão em profunda crise, por outro lado, nossas cidades também estão longe de terem seus desafios superados. Com estimativa de o crescimento da população urbana vir a atingir 68% do total da população em 2050 (United Nations Human Settlements Programme [UN-Habitat], 2022), temos por resolver desafios gigantes de desigualdade, diversidade e solidariedade, governação participativa e integrada, sustentabilidade e erradicação da pobreza. A cidade deve assegurar serviços e infraestrutura básica e cumprir a sua função social, o que tem se demonstrado uma missão não cumprida. As urgências do mundo contemporâneo cada vez mais deslocam a perspetiva da cidade enquanto consumidora passiva de recursos para passar a entender o espaço urbano como produtor de dinâmicas que, a partir do local, estão conectadas aos desafios globais — o espaço do glocal, onde o global ganha uma materialidade localizada.
A partir de contribuições que apontam para caminhos decoloniais de leitura das cidades, vários autores têm trazido reflexões acerca da necessidade de atualização teórica e de revisão política acerca de nossas cidades, informada a partir de um olhar do Sul Global (Roy, 2009). Outros autores sugerem a necessidade de abordagens interdisciplinares, sensíveis às experiências dos sujeitos (Sennett, 2020) e às invisibilidades urbanas (Fortuna, 2002, 2020), que demandam um novo léxico e uma nova geografia das metrópoles do séc. XXI (Roy, 2009). Colocar a comida no centro do debate urbano — e o urbano no centro do debate alimentar — poderá permitir uma aproximação mais contextualizada às dinâmicas e práticas urbanas, uma vez que parte de uma prática cotidiana, culturalmente condicionada, e que emerge a partir da realidade complexa de cada território. Esse gesto epistemológico pode assim contribuir para uma revisão política das nossas cidades, uma geografia das metrópoles que situe os sujeitos no centro do seu debate, de forma articulada com os desafios globais do mundo contemporâneo.
Comida enquanto fato social localizado
Em “A sociologia da refeição”, Simmel descreve a refeição enquanto um “evento primitivo de uma comunalidade inescapável” (cf. tradução de Symons, 1994, p. 346) — todos precisamos de comer, todos os dias, e ao fazê-lo estabelecemos uma relação entre os corpos-sujeitos e entre estes e a materialidade do mundo, a partir de um processo codificado culturalmente em refeições.
O modo como comemos tem organizado as nossas sociedades ao longo dos tempos — é à volta da fogueira, na caça e coleta por comida, nos modos de produção, que nossas sociedades têm sedimentado práticas, rituais, estruturas, territórios. Braudel, no icónico Afterthoughts on material civilization and capitalism, menciona como a prevalência da produção do milho nas Américas, do arroz na Ásia e do trigo na Europa produziu sociedades distintas, com tempos e espacialidades distintos (Braudel, 1985).
Comer exige um conjunto complexo de relações sociais, económicas, políticas, inseridas no sistema alimentar. Ao sistematizar a profunda relação existente entre comida, lugares e dinâmicas relacionais, Carolyn Steel apresenta o conceito de Sitopia, uma palavra resultante da contração de dois termos gregos — Sitos (comida) + Topos (lugar) (Steel, 2020). Por Sitopia entende-se a possibilidade de ler o mundo a partir das lentes da comida, num reconhecimento do seu papel central no conjunto de estruturas, de espaços, de interações que se promovem desde o âmbito mais íntimo até à escala mais global e compartilhada. Para Steel, a leitura do mundo a partir de uma abordagem Sitópica poderá ser instrumental para intervir nas dinâmicas contemporâneas e de caminhar rumo a possibilidades outras de estar e interagir com o mundo. Em vez de uma utopia que é, em sua natureza, irrealizável, a Sitopia constitui-se enquanto possibilidade material e prática de intervir de forma positiva nos desdobramentos das relações estabelecidas no mundo, tendo a comida como ferramenta principal, estruturante do conjunto de relações que estabelecemos com espaços, com temporalidades e que vêm moldando as sociedades ao longo dos tempos. A conceitualização da Sitopia aparece pela primeira vez no contexto de uma reflexão acerca do papel da comida no desenvolvimento de nossas cidades[2] , ao reconhecer o ato de comer enquanto prática inserida num sistema complexo de relações, uma atividade que tem implicações em toda a sociedade, nas esferas econômicas, jurídicas, políticas e religiosas e que informa e organiza instituições e práticas. Poulain vai chamar ao conjunto de relações estabelecidas a partir da comida o espaço social alimentar (Poulain, 2004), e este pode ter dimensões materiais e simbólicas, configuradas a partir das práticas alimentares.
Comida enquanto fenómeno urbano — e urbanizador
O fenómeno complexo do comer acontece principalmente nas nossas cidades — é no meio urbano que 70% dos alimentos são consumidos e que 70% dos resíduos alimentares são produzidos (Food and Agriculture Organization of the United Nations [FAO], 2019). A forma como esse comer acontece depende tanto das condições socioeconómicas dos sujeitos quanto das características dos territórios. As cidades têm cada vez mais sido vistas como centrais no debate sobre a transformação dos sistemas alimentares e a comida tem ganhado algum protagonismo no debate acerca das urbanidades e seus desafios[3] , no entanto, pouca atenção tem sido dada por parte da investigação acerca das cidades e da sociologia urbana sobre a forma como comemos, as dinâmicas e fluxos da comida no espaço e as práticas sociais alimentares, e sua capacidade de transformar as nossas cidades e produzir urbanidades distintas.
Porém, perante tamanha complexidade do sistema alimentar, investigar a interligação complexa e tão entrelaçada da comida com as cidades não é simples. Nesse contexto, o conceito de paisagem alimentar urbana, enquanto resultado da relação entre três sistemas complexos — i) o alimentar / a comida; ii) o social / os sujeitos e iii) o urbano/as cidades — é uma possibilidade promissora de avanço.
O conceito de paisagem tem sido disputado em diversos campos de conhecimento. Recorre-se aqui a dois autores centrais para configurar a definição de partida da paisagem. Para Milton Santos, geógrafo brasileiro, a paisagem é o depósito dinâmico do conjunto de relações que se estabelecem num determinado espaço ao longo do tempo, entre sujeitos e o território. Entende a paisagem como resultado de uma sobreposição de relações e ações, intermediada por objetos e técnica. Para Santos, poderemos entender o espaço lendo-o a partir do acúmulo inserido na paisagem (Santos, 2002). O conceito de paisagem estrutura-se em diversas escalas e dinâmicas e, nesse sentido, é interessante considerar a forma como Appadurai configura as paisagens, ou o conceito de scapes como construções fluidas e em permanente relação com as dinâmicas do mundo contemporâneo e globalizado (Appadurai, 1996). Entende as paisagens como fluxos de circulação e, nesse sentido, os sistemas alimentares e suas dinâmicas permanentes constituem paisagens em diversas escalas — do local e do íntimo do consumo, ao global das grandes escalas onde circulam as cadeias de suprimentos e distribuição globais. Entender a paisagem como resultado relacional entre sujeitos e territórios, fruto de ação, ao longo do tempo, e a partir de fluxos permanentes permite operar o conceito para colocar o espaço alimentar enquanto paisagem dinâmica do cotidiano.
A partir do desdobramento do conceito de paisagem enquanto espaço humano, em permanente transformação, e que integra cultura e sistemas naturais numa perspectiva histórica, entende-se aqui por paisagem alimentar a materialização no espaço-tempo social do nexo sujeitos-comida-território, composta pelo conjunto de lugares e espaços onde “the places and spaces where you acquire food, prepare food, talk about food, or generally gather some sort of meaning from food” [se adquire a comida, prepara a comida, fala sobre a comida, ou simplesmente se acumula algum significado a partir da comida] (MacKendrick, 2014, p. 16). A paisagem é um espaço social alimentar (Poulain, 2004), permeado por um conjunto possivelmente infinito de relações, uma paisagem dinâmica, moldada continuamente a partir dos contextos e dos cotidianos, e que inclui arranjos institucionais, espaços culturais e discursos — ou seja, acolhe o comer enquanto fato social total e profundamente relacional. As paisagens alimentares permitem o reconhecimento da sua própria transformação por meio da interação entre os sujeitos e a comida, dos sujeitos entre si por meio do comer, e dos sujeitos com o território a partir desse conjunto de relações. Quando inserida nas cidades, a paisagem alimentar urbana resulta do conjunto complexo de relações estabelecidas no território, que dependem por sua vez da diversidade de culturas, de políticas, de geografias, de espacialidades, valores, inseridas nesse território. Uma mesma cidade acolhe em si um conjunto diverso de paisagens alimentares, um mesmo bairro pode ser lugar de uma série de paisagens alimentares que caracterizam o conjunto de suas especificidades. Os lugares onde se interage com a comida, os tempos em que isso acontece, como isso se faz, e os significados que se produz a partir dessas práticas serão tão diversos quanto diverso for cada lugar. Por isso, a paisagem alimentar urbana mostra-se como uma lente riquíssima de leitura das urbanidades — tanto de seus elementos mais visíveis e evidentes quanto daqueles mais sensíveis e invisíveis.
A paisagem alimentar e a produção do espaço-tempo social
Para Lefebvre o espaço é um produto social, resultante do conjunto de relações e dinâmicas em curso nos territórios (Lefebvre, 1991). O espaço é indissociável do tempo e ambos são socialmente determinados, sendo o espaço sempre um espaço-tempo social. Lefebvre propõe que para o estudo da produção do espaço devem ser olhadas três dimensões: o espaço concebido (aquele que é planeado, abstrato, que advém das estruturas estabelecidas); o espaço vivido (aquele que é praticado pelos sujeitos no seu cotidiano) e o espaço representacional (aquele que é imaginado pelos sujeitos a partir da sua experiência). Entender como as três dimensões espaciais são produzidas permitirá um conhecimento sobre como o espaço-tempo social se produz e reproduz em cada contexto.
Sendo a paisagem alimentar urbana um conjunto de relações produzidas e produtoras da relação entre sujeitos-territórios-comida, nela o social, o fisiológico e o imaginário se encontram e intersectam. Esses encontros acontecem ora em disputa, ora em consonância com os espaços concebidos e planeados a partir de estruturas políticas de poder. Nesse sentido, se a comida provoca um conjunto dinâmico e contínuo de relações, inseridas em arranjos institucionais concebidos, performadas em espaços praticados e promotoras de imaginários e símbolos do espectro sensível, ela é em si mesma produtora de espaço-tempo social. Os espaços de comer e da comida, os tempos marcados das refeições, os modos de interação social em torno do alimento e das refeições, demarcam e ilustram o estar urbano, e denotam possibilidades de habitar nossos territórios. As paisagens alimentares são ecossistemas produzidos a partir de uma necessidade fundamental cotidiana — comer — mediada a partir do encontro entre os sujeitos (suas agências e suas condições sociodemográficas) e os territórios (suas estruturas, instituições, geografias). A partir das práticas dos sujeitos, as paisagens alimentares ilustram como estes produzem e reproduzem as relações com a cidade — como habitam a cidade.
A partir da conceitualização Lefebvriana de produção de espaço e da construção semântica da paisagem alimentar urbana enquanto espaço Sitópico, coloca-se como hipótese que a paisagem alimentar urbana seja produtora de espaço urbano concebido (capaz de produzir novas representações do espaço); vivido (capaz de promover novas práticas espaciais situadas) e representacional (capaz de compor imaginários e subjetividades na relação estabelecida com a cidade). Em seguida propõe-se um olhar acerca de cada uma das dimensões, complementado com exemplos práticos onde é possível identificar essa produção.
Comida e as três dimensões da produção do espaço
Comida e a produção do espaço concebido
O planeamento urbano tem ignorado amplamente as questões alimentares, e até o início dos anos 2000 a comida permaneceu uma estranha ao planeamento urbano (Cabannes & Marocchino, 2018; Pothukuchi & Kaufman, 2000). Essa realidade tem mudado desde então, e diversas cidades têm desenvolvido suas políticas alimentares urbanas inseridas nos processos de governação municipal e no delinear das diretrizes de desenvolvimento urbano (Sonnino, 2016). As cidades são hoje, reconhecidamente, responsáveis pelo sistema alimentar atual e é a partir delas que estes poderão ser transformados (FAO, 2019).
No projeto de cidade sistémica, em Casablanca, Marrocos, a comida é inserida no pensamento urbano a partir de uma proposta de restruturação do nexu entre os fluxos de comida e os fluxos de água na cidade, de forma absolutamente integrada (Kasper et al., 2017). Já na cidade de Curitiba, as ações de agricultura urbana planeadas pela gestão municipal incluem uma série de iniciativas que vão desde educação alimentar em escolas até o projeto de Hortas Comunitárias Urbanas que destina terrenos que ficam sob as linhas de alta tensão de distribuição elétrica para a produção de alimentos, fazendo simultaneamente uso de espaços ociosos e contribuindo para a garantia de segurança alimentar da população. Em 2024 a cidade contava com 170 hortas comunitárias urbanas impactando na vida de aproximadamente 37 mil moradores (EXAME Agro, 2024). Tomando como partida os dois exemplos apontados, juntamente com os estudos mais recentes acerca da concepção de cidade em relação com a sua paisagem alimentar, identifica-se a comida como ativo capaz de produzir pensamento e planeamento interdisciplinar e multiterritorial, ao atravessar diversas agendas de governação (como água e produção agrícola, por exemplo) e de cruzar múltiplos territórios (a partir de um entendimento da cidade como consumidora e produtora em uma região, numa interrogação atualizada acerca da separação entre cidade e campo).
A paisagem alimentar produz possibilidades outras de pensar e planear a cidade e o movimento recente de inserção da comida nas representações do espaço e no planeamento das cidades tem permitido novos mecanismos de regulação e arranjos de governação multidimensionais e interdisciplinares. Temas como o turismo gastronómico, a festivalização da comida no ambiente urbano, a inserção da comida como estratégia em processos de renovação urbana têm-na colocado como elemento fundamental na redefinição dos atrativos e das culturas urbanas (Richards, s.d.), com impactos diretos na formulação das políticas urbanas e no debate tanto sobre microgeografias de gentrificação (Bridge & Dowling, 2001) ou de integração (Raman, 2011). A produção da paisagem alimentar urbana tem ainda fortalecido o desenho de estruturas de governação e de participação integradas (Cabannes & Marocchino, 2018; Sonnino, 2016).
Comida e a produção do espaço praticado
Food, in turn, is central to urbanism, because it is so critical to creating and maintaining this vitality, complexity and intimacy, because it can help make and support walkable, mixed, human-scaled and diverse places and because it can increase the focus of urban space on the public realm. [A comida é central ao urbanismo, porque ela é tão crítica em criar e manter esta vitalidade, complexidade e intimidade, porque pode ajudar a manter e produzir lugares caminháveis, de uso misto, de escala humana e diversos e porque ela é capaz de aumentar o foco do espaço urbano no interesse público.] (Parham, 2015, p. 2)
Na interação dos sujeitos com a comida na cidade produzem-se ritmos, desenham-se rotas, concebem-se espacialidades. A comida é repleta de rituais, que são diferentes a depender dos sujeitos e suas culturas, dos territórios e dos momentos históricos. Mudam os espaços (onde se come), mudam os tempos (quando e por quanto tempo se dedica ao comer), muda a qualidade das relações (com quem comemos, como interagimos com quem produz ou comercializa o alimento, etc.).
Assim, as práticas alimentares localizadas no território vão produzir relações, rotas, temporalidades, que resultam das táticas que os sujeitos traçam para mediar o seu desejo individual com as condições materiais existentes e as normas culturais, uma produção e reprodução da gramática de relação com a cidade, constantemente reinventada e redesenhada. O ambiente alimentar existente (a cidade concebida) vai condicionar dinâmicas de espaço e tempo social que serão disputadas, experimentadas e redesenhadas a partir das práticas dos sujeitos e de suas motivações.
Alguns debates contemporâneos têm emergido dessa prática da comida na cidade e de como essas estão em constante reedição e em disputa, e como essas práticas exigem novas configurações conceituais e teóricas na categorização dessas paisagens (Battersby, 2019). Práticas de informalidade na paisagem alimentar e iniciativas de construção de processos comunais e solidários são exemplos de dinâmicas produzidas nos territórios (pelos sujeitos, a partir da comida) que apontam possibilidades de disputa pelo direito à cidade, táticas para a garantia do direito humano à alimentação em territórios urbanos periféricos ou para grupos sociais vulnerabilizados. Da mesma forma, a transformação digital acelerada tem transformado as práticas dos sujeitos nas paisagens urbanas e as experiências situadas na relação entre sujeitos e comida nos espaços poderá informar sobre processos de hibridização dos espaços (Fodor, 2021) e alertar para as mudanças nos modos de habitar as cidades. As práticas inseridas nas paisagens alimentares reconfiguram a experiência do espaço público, e promovem dinamismo e convivialidade (Parham, 2015), a partir dos cotidianos dos sujeitos. Um estudo acerca das práticas e motivações presentes no consumo alimentar em uma feira em Cuiabá (Mato Grosso, Brasil) evidenciou como a experiência da feira representa uma apropriação da rua pelos sujeitos e uma inserção de seus valores, perfis e contextos na produção dessa paisagem alimentar, e o quanto essa prática existe entre o conjunto de desejos e o espaço concebido — onde a feira acontece, quando a feira acontece — “porque é perto e porque é sábado” (Arruda & Abonizio, 2016).
Uma experiência recente de transformação das paisagens alimentares urbanas tem se dado nos últimos anos, com a transformação acelerada das dinâmicas de distribuição de alimentos em contextos urbanos a partir do crescimento dos modelos de entrega por delivery. Esse fenómeno, muito impulsionado pelo período da pandemia de SARS-CoV-2 onde grande parte da população viu a sua mobilidade na cidade absolutamente limitada, tem tido impactos diretos tanto em hábitos de consumo quanto nas espacialidades que essas dinâmicas produzem. Espaços como as dark kitchens[4] , rotas e ritmos de consumo alimentar, a proliferação da distribuição de comida pela cidade por entregadores, têm criado paisagens novas e hibridizado espacialidades ligadas à alimentação. Cidades como Barcelona têm lançado mão de legislação que regula a existência das dark kitchens, para que sejam localizadas em áreas industriais ou nos subúrbios urbanos com a justificativa de preservação da qualidade de vida urbana (tanto para moradores quanto para lojistas) (Faus, 2023), e o hibridismo dos novos espaços e dinâmicas é tema de interesse crescente na pesquisa e no debate sobre sistemas alimentares urbanos (Fodor, 2021).
Comida e a produção do espaço simbólico / representacional
Como refere Simmel as nossas práticas da comida são sujeitas a uma comunalidade inescapável (cf. tradução de Symons, 1994) e são configuradas culturalmente (Azevedo, 2017). O que comemos, quando, onde, com quem, por quanto tempo, são eventos repletos de simbologia e de subjetividades, caracterizam sociedades, experiências, temporalidades e geografias específicas. Esse carácter simbólico da comida tem sido usado em produtos culturais como o filme In the mood for love, de Won Kar-Wai (2020), uma obra que foi pensada inicialmente como ilustração da cultura alimentar de Hong Kong, sobre as práticas do comer no território e que acabou por se configurar como uma ode às relações e encontros humanos. A comida atravessa toda a obra, marca os tempos e dá uma qualidade sensível à experiência dos espaços.
Ainda em Hong Kong, um outro grupo social tem sido capaz de se expressar a partir da comida. Todos os domingos, desde 1980, cerca de trezentas mil mulheres filipinas emigrantes encontram-se no rés-do-chão dos prédios do distrito financeiro da cidade (Dwyer, 2016). Nesses encontros, as mulheres compartilham comidas tradicionais filipinas, trocam receitas, comercializam informalmente as refeições, enquanto debatem acerca de questões femininas, de seus desafios e disputas comuns.
A comida nos territórios produz diferentes modalidades de relação entre os sujeitos e destes com os lugares, e em níveis de intensidade distintos — maior ou menor integração, assimilação ou multiculturalidade, solidariedade, visibilidade, comunalidade, ajuda mútua ou de segregação, entre outros. A comida é um elemento importante na luta e afirmação do direito à cidade, mediadora de dinâmicas de reinvindicação e de re-invenção de um urbano possível. No Rio de Janeiro, o projeto Maré de Sabores, no bairro da Maré, produz uma gastronomia mareense, inventada a partir das experiências materiais e simbólicas dos sujeitos, e que resulta da intersecção entre as suas histórias e a possibilidade de habitar uma cidade que historicamente segrega e invisibiliza as práticas oriundas dos seus bairros populares (Redes da Maré, s.d.). A gastronomia mareense é instrumento do seu desenvolvimento territorial, capaz de produzir novas simbologias e de desenhar um imaginário de cidade que parte das experiências, da riqueza e da criatividade desse território (Matos, 2021).
Já na comunidade quilombola Cafundá Astrogilda, também no Rio de Janeiro, a produção agrícola, ancorada nos meios tradicionais de vida da comunidade remanescente de uma população escravizada, foi instrumento central no processo de reconhecimento do quilombo e de garantia do direito a habitar essas terras. Para as famílias do Cafundá, produzir alimentos no território é símbolo da sua história e é a possibilidade de produzir o imaginário de cidade como produtora de alimentos, uma cidade que tem a sua história cultural, social e a sua paisagem natural, intersectadas nessas experiências de vida.
A partir do gesto cotidiano do comer e das intersecções que os sujeitos fazem com a cidade promovidas pela comida, produzem-se possibilidades outras de ler a cidade. Ao interagir com a comida, o espaço, o tempo e as relações são experimentadas e reinventadas. No gesto de interação com a comida os sujeitos deslocam simbolicamente os territórios enquanto incorporam os territórios, movimentam-se em temporalidades distintas e ritualizam modos de relação constantemente reinterpretados — com quem produz a comida, com quem se divide a refeição, com quem a comercializa.
Ao ocupar os lugares, ao habitar a cidade, a paisagem alimentar produz espaços do sensível e do sensorial, resultado da relação dos sujeitos, da comida e dos lugares, onde “(…) city and country emerge as one continuous territory in which terroir, traditionally linked to the soil, is seen to transcend the urban-rural boundary [(…) cidade e campo emergem como um território contínuo onde o terroir, tradicionalmente associado ao solo, transcende a fronteira urbano-rural] (Steel, 2013, p. 322).
Conclusão: um contributo teórico para o estudo das urbanidades
As paisagens alimentares urbanas, se usadas enquanto referencial teórico de investigação acerca das cidades, poderão trazer diversos contributos para o entendimento das urbanidades contemporâneas. Em primeiro lugar, estas constituem referenciais de operacionalização de Sitopias concretas, uma vez que ao inquirir sobre o modo como operam nossas urbanidades permite identificar possibilidades de intervenção urbana que alavanque transformações positivas nos territórios a partir das relações que nestes se estabelecem. Nesse sentido, elas localizam os desafios urbanos de forma universalmente compartilhada, intrinsecamente íntima, socioculturalmente determinada. Em segundo lugar, as paisagens alimentares urbanas são em sua essência contrárias a setorizações disciplinares, uma vez que apontam para um conjunto de interrogações multidimensionais e multiterritoriais, reativas por natureza a qualquer enclausuramento disciplinar (Fischler, 1995).
As paisagens alimentares urbanas atravessam um conjunto de invisibilidades urbanas a partir do seu carácter simultaneamente subjetivo e objetivo, do universo do sensível/simbólico e do material/concreto.
Os estudos das paisagens alimentares, entendidas como intersecção entre sujeitos-comida-territórios, paisagens produzidas e reproduzidas nas vidas e experiências cotidianas de todos os sujeitos em todos os lugares, constituem possibilidades de aprofundar o estudo das urbanidades, os estudos alimentares de forma integrada e ajudam a informar — a partir dos cotidianos dos sujeitos — uma série de debates urgentes contemporâneos. A possibilidade de ler a cidade pelas lentes da comida e suas relações situadas é um campo de investigação promissor, capaz de informar as novas geografias dos estudos da metrópole. As paisagens alimentares poderão aportar recursos para a maior compreensão das novas geografias da metrópole (Roy, 2009) e de aportar novas gramáticas urbanas capazes de olhar a complexidade das cidades em diálogo com as novas geografias da segurança alimentar e nutricional (Sonnino, 2016).
Referências
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Data de submissão: 29/01/2024 | Data de aceitação: 11/11/2024
Nota
Por decisão pessoal, a autora do texto escreve segundo o novo acordo ortográfico.
[1] Este texto resulta da investigação em curso no âmbito do Doutoramento em Sociologia: Cidades e Culturas Urbanas, da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, com a Tese “Comida e Urbanidades: a produção das paisagens alimentares urbanas — o Rio de Janeiro”, orientada pelo Prof. Dr. Carlos Fortuna, acolhida pelo CES-UC e financiada com Bolsa de Doutoramento pela Fundação Ciência e Tecnologia (FCT).
[2] Steel apresenta o conceito Sitopia no último capítulo do seu primeiro livro Hungry City, onde coloca ênfase no impacto do comer urbano no conjunto mais amplo de impactos globais (Steel, 2013).
[3] No texto da Nova Agenda Urbana, a comida é reconhecida enquanto desafio que acomete também às cidades endereçar. O tema da comida é tratado com relevância dentro de grandes temas da agenda, como do compromisso que as cidades têm sobre seu futuro, seus processos de governação, sua resiliência, o seu desenvolvimento territorial e do desenvolvimento urbano sustentável como um todo (United Nations Human Settlements Programme [UN-Habitat], 2017). Redes internacionais de cidades como o Pacto de Milão (Milan Urban Food Policy Pact [MUFPP], s.d.) iniciativas como a europeia Farm to Fork Strategy (European Commission, s.d.), programas como Food Trails (Eurocities, s.d.) ou, no Brasil, o Laboratório Urbano de Políticas Públicas alimentares (Comida do Amanhã, s.d.) são exemplos de como na última década essa é uma pauta crescente nos debates urbanos.
[4] Dark kitchens são locais onde se produz alimentos para venda exclusiva por delivery. Desse modo, os espaços não preveem área de atendimento presencial ou espaço para retirada de alimentos (tipo take–away), podendo operar em espaços como containers, áreas sem janelas, e sem relação com o espaço público. Por serem cozinhas de preparo exclusivo para delivery, geralmente no seu entorno existe uma ampla circulação de entregadores que trabalham em sistemas de distribuição de comida por aplicativo.
Autores: Mónica Guerra da Rocha