N.º 36 - dezembro 2024

Mariana dos Anjos Ramos Carvalho e Silva
FUNÇÕES: Concetualização, Curadoria de dados, Análise formal, Investigação, Recursos, Visualização,
Redação do rascunho original, Redação — revisão e edição
AFILIAÇÃO: Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra, Portugal
& Grupo de Pesquisa em Migração e Direito Internacional do Trabalho
da Universidade de São Paulo (GEMDIT-USP) & Advogada sócia na Anjos Ramos Sociedade de Advogados.
Av. Marquês de São Vicente, 405, 01139-001, São Paulo/SP, Brasil
E-mail: mariana@anjosramos.com.br | ORCID: https://orcid.org/0000-0003-1750-7417

Resumo: O estudo aborda a Síndrome do Esgotamento Profissional (burnout) no contexto do Direito do Trabalho, especialmente após a pandemia de COVID-19, que intensificou a virtualização do trabalho e a sobrecarga mental dos trabalhadores. A síndrome é reconhecida pela Organização Mundial da Saúde (OMS), através da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), na Classificação Internacional de Doenças (CID-10) sob o código Z73.0, definido como um estado de esgotamento vital. A pesquisa analisa 39 acórdãos do Tribunal Regional do Trabalho da Segunda Região (TRTSP) relacionados com o burnout como doença ocupacional. Utilizando uma abordagem empírica quantitativa e estudo de caso com leitura crítica dos acórdãos, procura-se identificar: o reconhecimento judicial do burnout como doença ocupacional, a existência de nexo causal direto ou indireto entre a atividade desempenhada e o surgimento do burnout, a responsabilidade pela prova do nexo causal, e a forma de condenação em caso de reconhecimento de dano ao trabalhador. Os resultados destacam o reconhecimento do burnout como doença ocupacional e a dificuldade na sua comprovação, especialmente devido à atribuição do ônus da prova ao reclamante. Há uma preferência pela compensação de danos morais, com poucos casos de deferimento de pensão mensal. O estudo sugere a transferência do ônus da prova para o réu quando já houver prova documental robusta, enfatizando a importância do ambiente de trabalho, especialmente em instituições financeiras.

Palavras-chave: nexo causal, burnout, julgados, empregado.

Abstract: The study examines Burnout Syndrome in the context of Labor Law, particularly in the aftermath of the COVID-19 pandemic, which has intensified the virtualization of work and the mental overload of workers. The syndrome is recognized by the World Health Organization (WHO), through the Pan American Health Organization (PAHO), in the International Classification of Diseases (ICD-10) under the code Z73.0, defined as a state of vital exhaustion. The research analyzes 39 rulings from the Regional Labor Court of the Second Region (TRTSP) concerning burnout as an occupational disease. Using a quantitative empirical approach and a case study with critical reading of the rulings, the study aims to identify: the judicial recognition of burnout as an occupational disease, the existence of a direct or indirect causal link between job activities and the onset of burnout, the responsibility for proving the causal link, and the form of compensation awarded in cases where harm to the worker was recognizes. The results highlight the recognition of burnout as an occupational disease and the challenges in proving it, particularly as the burden of proof lies with the claimant. Compensation for moral damages is preferred, with only a few cases awarding monthly pension allowances. The study suggests shifting the burden of proof to the defendant when substancial documentary evidence has already been presented, emphasizing the importance of the work environment, especially in financial institutions.

Keywords: causal link, burnout, sentence, employee.

Introdução

As preocupações em torno da saúde do empregado são objeto de estudo vasto no campo do Direito do Trabalho. Com a chegada da pandemia do COVID-19, a Síndrome do Esgotamento Profissional, denominada burnout, passou a ocupar um espaço ainda significativo nesse contexto em razão da virtualização do trabalho e da sobrecarga mental a que muitos foram submetidos.

No Brasil, o conceito de acidente do trabalho é amplo, abrangendo tanto as doenças profissionais e do trabalho, como outros eventos acidentários. A Lei n.º 8.213 (1991)[1] traz as disposições a respeito da conceituação e das situações que se enquadram ou não como acidente do trabalho ou a ele se equiparam.

A burnout se caracteriza pela elevada carga de estresse no ambiente de trabalho a qual é imposta ao empregado. Os sintomas mais comuns são exaustão emocional, avaliação negativa de si mesmo, depressão e até mesmo indiferença emocional com relação ao mundo. Nesse sentido, Vieira (2010) afirma que se trata ainda de um conceito em construção, não fechado, abordando a exaustão e a possibilidade de uma despersonalização vinculada a sua definição[2]. Trata-se de uma das consequências da precarização e da intensificação das relações de trabalho, em razão do estado de tensão emocional e estresse crônico provocado pelas condições desgastantes do trabalho, na percepção de Alvim e Viana (2021)[3].

Em outras palavras, as agressões psíquicas sempre estiveram presentes, porém não com a intensidade com que hoje, com o avanço da tecnologia, se tem conhecimento, especialmente via redes sociais. Na pandemia, muitos casos vieram à tona, como exemplificativamente a obrigatoriedade de empregados permanecerem com o aplicativo Zoom ligado em suas casas, durante o período de trabalho, de forma constante para que pudessem ser supervisionados por seus gestores.

A metodologia utilizada nesse estudo será a empírica quantitativa e estudo de caso, a partir da leitura crítica de julgados pré-selecionados. A partir das ocorrências da expressão (burnout) no sistema do Tribunal Regional do Trabalho da Segunda Região, o objetivo é expor como o Judiciário Trabalhista brasileiro trata o tema atualmente, por meio de estudo de casos, considerando se a doença é tratada como de caráter profissional, se na maior parte do caso há o reconhecimento de nexo causal com a atividade profissional exercida, se na modalidade direta ou indireta, bem como qual o percentual de casos em que há o deferimento de indenização ao trabalhador em razão do acometimento pela burnout. O artigo inova ao pretender inferir os principais pontos de achados encontrados que não estão citados nas decisões, mas que podem ajudar a compreender a gravidade e pensar soluções para o tratamento adequado dos casos.

Legislação brasileira sobre a burnout

A síndrome de burnout integra o rol de doenças ocupacionais do Ministério do Trabalho e Emprego no Brasil inserida no Anexo II do Regulamento da Previdência Social. O Anexo II identifica os agentes patogênicos causadores de doenças profissionais ou do trabalho, conforme previsão do artigo 20.º da Lei n.º 8.213 (1991). Entre os transtornos mentais e de comportamento relacionados ao trabalho (Grupo V da CID-10) consta, no item XII, a síndrome de burnout: “Sensação de Estar Acabado (Síndrome de Burnout, Síndrome do Esgotamento profissional)”, que na CID-10 é identificado pelo número Z73.0. A síndrome é reconhecida pela Organização Mundial da Saúde (OMS) por meio da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS).

O empregado brasileiro tem como direito a redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio das normas de saúde, higiene e segurança, tal qual previsto no artigo 7.º, inciso XXII da Constituição Federal (1988). O mesmo diploma prevê o dever de reparação em danos morais e materiais para os casos de reconhecimento de doença ocupacional e do trabalho, nos termos do artigo 7.º, inciso XXVIII (garante ao trabalhador seguro contra acidentes do trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa) e dos artigos 927.º, 186.º, 949.º e 950.º do Código Civil (Lei n.º 10.406, 2002). O artigo 225.º, caput, da Constituição Federal (1988) assegura a todos um meio ambiente ecologicamente equilibrado, aí incluído o meio ambiente laboral. O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu também por meio do Tema n.º 932 (2020)[4] a possibilidade de responsabilização objetiva do empregador por danos decorrentes de acidente do trabalho nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida, por sua natureza, apresentar exposição habitual a risco especial, com potencialidade lesiva e implicar ao empregado ônus maior do que aos demais membros da coletividade. O tema, como visto, pode ser passível de aplicação no caso da burnout, em algumas situações.

O aparecimento do tema em processos judiciais laborais teve um aumento expressivo nos últimos anos. É possível verificar empiricamente a ocorrência do termo de pesquisa “burnout” nas bases do Tribunal Regional da Segunda Região (TRT-SP) para os processos distribuídos no período anterior a pandemia (01 de janeiro de 2019 até 31 de dezembro de 2019), o qual somam 118 ocorrências; comparando com a ocorrência do mesmo termo “burnout” para o período após 2021 (considerando como data de distribuição de 01 de janeiro de 2022 até 31 de dezembro de 2022), o qual somam 256 ocorrências. Dessa forma, há uma superação de mais que o dobro de ocorrências do ano anterior se comparados ao período anterior ao início da pandemia do COVID-19 (março de 2020 no Brasil).

A análise empírica no TRT-SP

A metodologia utilizada será a empírica quantitativa por meio de análise de um conjunto de casos específicos no tema, juntamente com o estudo de caso, a partir da leitura crítica dos julgados.

Das ocorrências encontradas no Poder Judiciário Trabalhista no período pós surgimento do COVID-19, ano de 2022, foram então segmentados para a pesquisa, que rastreou 39 julgados[5] no tema com a palavra-chave “burnout”, com o filtro acórdão, com data de distribuição ao Tribunal Regional da Segunda Região — São Paulo entre 01 de janeiro de 2022 e 01 de janeiro de 2023. O Tribunal Regional da Segunda Região — São Paulo possui 18 turmas de julgadores, sendo que o universo da pesquisa analisou julgados de 15 turmas.

A partir desses estudos de casos, o estudo analisa i) se há ou não o reconhecimento da burnout como doença profissional ou como decorrente de outros fatores, ii) se há o reconhecimento de nexo causal de forma direta ou de forma indireta entre a atividade exercida e o aparecimento da burnout, iii) se coube ao empregado ou ao empregador o ônus de comprovar o nexo causal, bem como iv) tipo e valor de condenação em caso de reconhecimento do dano ao empregado.

Diante dos parâmetros estabelecidos, é possível verificar que houve o reconhecimento nos fundamentos das decisões da Síndrome de Esgotamento Profissional (burnout) como uma doença profissional em 87,18% dos casos (34 em um universo de 39 julgados), mesmo quando para o caso em comento não se havia reconhecido o nexo com o trabalho diante das provas produzidas. Em 12,82% dos casos, houve o entendimento de que se trata de uma patologia mental com diversas causas.

Em 15,38% dos casos, houve o reconhecimento de nexo causal direto, sendo dito no acórdão que se reconhece o nexo causal. Em 28,21% dos casos foi respondido que o nexo foi “concausal”. Em 56,41%, não houve o reconhecimento de nexo causal no julgado.

Os julgados reconhecem que se trata de ônus do empregado em 82,05% dos casos, reconhecendo que incumbia ao reclamante juntar aos autos as condições de trabalho já que o laudo demonstrava o contrário ou não era suficiente para formar o entendimento do julgador. Em 17,9% dos casos, se entendeu que o ônus competia ao reclamado de juntar as provas aos autos que demonstrassem que as condições de trabalho iam contra aquelas que foram as causadoras da burnout, visto que os laudos a apontavam como causa.

Do universo de 39 julgados, houve condenação em 35,89% dos casos. Em 30,76% dos casos (12 julgados), restou determinada a condenação em forma indenizatória, ao passo que 5% (2 processos) o pensionamento mensal foi deferido como forma indenizatória.

Análise crítica dos julgados

Em apenas 7,6% dos casos (3 julgados), o laudo pericial é desconsiderado para a resolução do caso, sendo levado em consideração outros parâmetros. Nesse ponto, se levanta a importância do trabalho dos peritos judiciais, que são em regra de confiança e nomeados pelo juiz do trabalho em primeira instância e que não possuem um modelo padronizado para a realização da perícia no campo psiquiátrico e psicológico (somente as previsões de cada Conselho Profissional). Existe também o questionamento da especialidade desse perito, eis que possuem a titulação como “médico do trabalho”, sem a especialidade específica da psiquiatria ou psicologia em seu currículo e são nomeados para julgamento de casos de moléstias profissionais de ordem psiquiátrica.

Em um desses casos, o julgador constatou que a perícia foi realizada três anos após a dispensa e serviu apenas para constatar que já não existia mais incapacidade após o decurso de tanto tempo. O julgador [6], ao condenar a empresa, levou em consideração o fato de a reclamada descumprir as normas legais quanto à segurança, higiene, saúde e meio ambiente do trabalho; bem como em caráter pedagógico para que condutas de assédio por superiores hierárquicos mal preparados não venham a se reiterar dentro das empresas.

O segundo dado que chama a atenção no universo pesquisado é que 38,46% dos julgados, sejam eles favoráveis ou desfavoráveis, tem como parte demandada instituições financeiras (bancos), levantando o questionamento se o ambiente laboral bancário não seria também um fator a desencadear o estado de exaustão (vinculado ou não ao posterior reconhecimento da moléstia com nexo causal ou não com a atividade profissional) passível de ser enquadrado no Tema n.º 932 (2020) do Supremo Tribunal Federal (STF) com liame objetivo de responsabilização por se tratar de atividade normalmente desenvolvida, por sua natureza, com exposição habitual a risco especial, com potencialidade lesiva e implicar ao empregado ônus maior do que aos demais membros da coletividade.

O terceiro achado interessante do estudo é o fato da burnout não estar sempre vinculada a CID específica Z73.0, sendo muitas vezes reconhecida a CID F41.0 (transtorno ansioso) e F32 (episódios depressivos) como burnout. Importante salientar que a CID da burnout (Z73.0) é citada expressamente em apenas 15,38% dos julgados.

É identificado ainda uma situação que para o perito que fundamenta o entendimento dos julgadores (voto do relator)[7] não foi estabelecido o nexo causal nem concausal, porém o perito elenca alguns fatores importantes a serem levados em consideração para essa constatação: ausência de comprovação do integral cumprimento da legislação em vigor e do NTEP (Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário): ausência de emissão de Comunicação de Acidente de Trabalho (CAT); ausência de afastamento previdenciário; existência de quadro constitucional/congênito/genético; não reconhecimento de incapacidade e a inexistência de menção de quadro ocupacional na documentação médica apresentada.

Há julgados que também sugerem que o ambiente laboral de cobranças e atitudes dos superiores no controle das atividades como um dos fatores estressantes pelos quais se pleiteia o reconhecimento do nexo com a atividade profissional. Nesse sentido também é o entendimento de Alvim e Viana (2021), ao entender que as novas formas de trabalho exigem uma cobrança individual e uma responsabilização — aversão ao fracasso, intensificação e interiorização desse trabalho que podem levar a um desequilíbrio com os aspectos mais íntimos da vida emocional do trabalhador.

É constatado também dificuldade na prova por parte dos reclamantes quando se é citada expressamente a CID Z73.0 e o perito atrela o laudo às provas testemunhais a serem produzidas em audiência. Nesse caso, o laudo pode ser favorável, porém a ausência de testemunhas para comprovar situações do ambiente de trabalho que são as causadoras, levam os julgadores a indeferir a indenização. Melo e Caldas (2019 apontam em seus estudos a dificuldade de requerimento e deferimento no Judiciário laboral brasileiro de que o reclamado seja condenado ao ônus do tratamento psicoterápico e psiquiátrico no caso de reconhecimento do nexo causal com o trabalho. Os achados da pesquisa acima vão no mesmo sentido, haja vista a ausência de condenações nesse sentido no universo estudado.

Por fim, outro ponto levantado é a questão da necessidade de vistoria no local do ambiente de trabalho para que se possa cumprir o estabelecido no artigo 2.º da Resolução n.º 2.183 (2018), do Conselho Federal de Medicina[8]. Nesse sentido, não houve um julgado que determinou o retorno dos autos para que fosse feita a vistoria, porém é importante salientar que a presença da vistoria no local é um dos pontos previstos pelo Conselho Federal de Medicina para essa análise e que pode ajudar a comprovar as situações do ambiente laboral quando se tem uma dificuldade de levar as testemunhas até o juízo para depoimento no curso do processo.

Conclusão

O objetivo, a partir desse breve estudo de casos, é apontar os principais pontos de atenção para a Síndrome do Esgotamento Profissional nessa perspectiva empírica e análise crítica dos julgados no tema. O artigo pretendeu fugir da análise de prevenção da burnout tão comentada entre as empresas e verificar o todo, com especial atenção para as principais medidas de compensação e retaliação aplicadas em desfavor dos reclamados que em sua atuação favorecem o aparecimento desse tipo de doença profissional aos empregados no Brasil na jurisdição do Tribunal Regional do Trabalho da Segunda Região.

Em consulta ao Observatório de Segurança e Saúde no Trabalho (SmartLab, 2022) no Brasil, as notificações de Acidente de Trabalho por Capítulo CID — V — Transtornos mentais e comportamentais ocupam hoje o quinto lugar de maior acometimento. Ainda, os mapas do mesmo sistema mostram uma grande subnotificação dos acidentes de trabalho em todas as áreas, o que dificulta a prova em caso de posterior processo judicial. O conceito da burnout é um conceito em construção e que ainda é visto de forma discriminatória e como um estigma, tal qual era vista a depressão nas décadas de 1980 e 1990.

O breve estudo se trata de uma forma de apoio ao estudo do tema por meio de uma análise de casos restritas ao recorte temporal e julgados definidos com um universo de apenas 39 casos em curso do Tribunal Regional da Segunda Região — São Paulo. A ideia é conseguir ultrapassar a subnotificação dos casos para verificar como os conflitos são tratados no Poder Judiciário em âmbito de decisão de segunda instância.

Diante do quanto avaliado, é possível concluir que a maior parte dos julgados estabelece que a Síndrome de Esgotamento Profissional (burnout) se trata de uma doença de esgotamento profissional e não uma patologia mental com diversas causas. Na grande maioria dos casos (82%) se entendeu que cabe ao reclamante trazer o conjunto probatório aos autos (ônus da prova). Mais de 50% dos casos não resultam em indenização no Poder Judiciário, sendo que há uma dificuldade probatória por parte dos demandantes para comprovar o nexo causal. Nos casos em que há condenação, a maior parte reconhece o nexo concausal do trabalho na doença, sendo que em apenas 15% dos casos há reconhecimento do nexo causal direto. As formas de condenação são em sua grande maioria, quando concedidas, de cunho indenizatório; tendo sido concedido o pensionamento mensal em apenas 2 casos (5%).

Provavelmente em razão da pouca abordagem aprofundada no tema, as CIDs da depressão e dos transtornos ansiosos estão presentes nos achados da pesquisa e são também reconhecidas como burnout.

Diante desse cenário, é necessário repensar o ônus probatório ao empregado nos casos da burnout (Z73.0), quando já se houver documentação prévia robusta, tais quais: emissão de Comunicação de Acidente de Trabalho notificada, afastamento previdenciário com recebimento de benefício reconhecido perante o INSS e reconhecimento do Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário (NTEP) da burnout com a ocupação profissional. O laudo pericial de confiança do juízo atualmente é confirmado em mais de 90% dos casos que vão ao tribunal, havendo questionamento sobre a vistoria no local de trabalho ser um ponto imprescindível ou não desse documento.

Outro ponto de atenção que cabe ressaltar é que um dos achados da pesquisa trata de identificar que as instituições financeiras são as principais demandadas dos julgados estudados com relação à burnout; deixando a dúvida se esse ambiente laboral não deve ser considerado como um ambiente de risco habitual passível de reconhecimento de nexo causal direto e de responsabilização objetiva, tal qual os termos do Tema n.º 932 (2020) do Supremo Tribunal Federal (STF).

Referências

Alvim, J. L., & Viana, J. P. (2021). A precarização das relações de trabalho no cenário sócio-político contemporâneo: análise do tratamento médico-jurídico dado à Síndrome de Burnout. Revista Pleiade, 15(33), 63-74. https://pleiade.uniamerica.br/index.php/pleiade/article/view/709

Constituição Federal do Brasil. (1988). Dispõe sobre direito constitucional brasileiro. Planalto. https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm

Lei n.º 8.213, de 24 de julho de 1991, do Congresso Nacional. (1991). Dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social e dá outras providências. Planalto. https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8213cons.htm

Lei n.º 10.406, de 10 de janeiro de 2002, do Congresso Nacional. (2002). Institui o Código Civil. Planalto. https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm

Melo, A. K. B. de, & Caldas, L. P. (2019). Adoecimento mental do trabalhador: um olhar sistêmico. Revista do Tribunal Superior do Trabalho, 85(3), 176-190. https://hdl.handle.net/20.500.12178/165765

Resolução n.º 2.183, de 21 de junho de 2018, do Conselho Federal de Medicina. (2018). Dispõe sobre normas específicas para médicos que atendem o trabalhador. Diário Oficial da União, Seção 1, 206-207. https://www.cremesp.org.br/?siteAcao=PesquisaLegislacao&dif=s&ficha=1&id=15430&tipo=RESOLU%C7%C3O&orgao=Conselho%20Federal%20de%20Medicina&numero=2183&situacao=VIGENTE&data=21-06-2018

Tema n.º 932, de 26 de junho de 2020, de Repercussão Geral no Supremo Tribunal Federal — Relator Min. Alexandre de Moraes. Leading Case 828040. (2020). Dispõe sobre Possibilidade de responsabilização objetiva do empregador por danos decorrentes de acidentes de trabalho. Supremo Tribunal Federal. https://portal.stf.jus.br/jurisprudenciaRepercussao/verAndamentoProcesso.asp?incidente=4608798&numeroProcesso=828040&classeProcesso=RE&numeroTema=932

Vieira, I. M. (2010). Conceito(s) de burnout: questões atuais da pesquisa e a contribuição da clínica. Revista Brasileira de Saúde Ocupacional, 35(122), 269-276.

SmartLab. (2022). Segurança e Saúde no Trabalho — Áreas Prioritárias e Análise Comparativa. Consultado em 12 de julho de 2023, de https://smartlabbr.org/sst/localidade/0?dimensao=prioritarias

Data de submissão: 15/07/2023 | Data de aceitação: 08/07/2024

Notas

Por decisão pessoal, a autora do texto escreve segundo o novo acordo ortográfico

[1] Art.º 20.º e 21.º da Lei n.º 8213 (1991).

[2] Cf.:

O debate a respeito do conceito de burnout traduz o desejo de se compreender a sua “verdadeira natureza”, a sua “essência”. Essa tentativa de compreensão tem sido empreendida por meio da investigação científica baseada no método empírico. Curiosamente, as questões que emergem deste debate conceitual (se burnout é só exaustão, se a Despersonalização faz parte do conceito, se se trata de um tipo de resposta de estresse não necessariamente ligada ao trabalho) são justamente as questões nas quais a subjetividade está mais presente. É possível que elas reflitam uma limitação do método empírico (já que a sua ênfase está em descobrir os dados objetivos). (Vieira, 2010, p.274)

[3] Cf.:

Com base nesses estudos, pode-se verificar um caráter multidimensional e polissêmico da definição da síndrome, pois compreende três variáveis constitutivas que a especificam e determinam, quais sejam: a exaustão emocional, a despersonalização e a diminuição da realização pessoal. Percebe-se, assim, que se trata do profissional frustrado, descomprometido com os outros e exaurido emocionalmente. (Alvim & Viana, 2021, p. 65)

[4] Cf.:

O artigo 927, parágrafo único, do Código Civil é compatível com o artigo 7º, XXVIII, da Constituição Federal, sendo constitucional a responsabilização objetiva do empregador por danos decorrentes de acidentes de trabalho, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida, por sua natureza, apresentar exposição habitual a risco especial, com potencialidade lesiva e implicar ao trabalhador ônus maior do que aos demais membros da coletividade. (Tema n.º 932, 2020, para. 4)

[5] Casos estudados no recorte da pesquisa de julgados na base do TRT-SP (https://juris.trt2.jus.br/jurisprudencia/) com o tipo de documento “Acórdão” e no assunto “doença ocupacional” — 39 julgados encontrados sob os seguintes números de processo judicial, segundo a parametrização do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) do Brasil:
1000036-62.2022.5.02.0005
1000051-28.2022.5.02.0006
1000068-90.2020.5.02.0020
1000095-11.2022.5.02.0018
1000111-56.2019.5.02.0054
1000130-08.2022.5.02.0717
1000142-45.2021.5.02.0462
1000153-48.2022.5.02.0039
1000195-06.2022.5.02.0037
1000233-87.2022.5.02.0014
1000357-93.2020.5.02.0708
1000369.46.2021.5.02.0717
1000403-44.2021.5.02.0386
1000436-81.2020.5.02.0511
1000478-30.2021.5.02.0242
1000500-13.2021.5.02.0461
1000525-33.2020.5.02.0082
1000743-51.2021.5.02.0462
1000747-73.2022.5.02.0391
1000792-30.2020.5.02.0203
1000827-52.2020.5.02.0441
1000846-84.2019.5.02.0088
1000897-25.2021.5.02.0703
1000918-09.2021.5.02.0086
1000920-02.2020.5.02.0025
1000960-67.2021.5.02.0374
1000967-14.2019.5.02.0056
1001108-34.2021.5.02.0033
1001186-38.2019.5.02.0020
1001224-10.2020.5.02.0604
1001280-54.2021.5.02.0492
1001388-78.2021.5.02.0041
1001404-95.2019.5.02.0463
1001405-79.2020.5.02.0064
1001446-89.2019.5.02.0061
1001591-85.2019.5.02.0081
1001612-07.2021.5.02.0432
1001657-34.2019.5.02.0059
1001706-28.2020.5.02.0613

[6] Processo n.º 1000068-90.2020.5.02.0020. Relatora: Ana Paula Scupino Oliveira, julgamento em 10 de março de 2023.

[7] Processo n. 1000036-62.2022.5.02.0005. Relatora: Ana Maria Moraes Barbosa Macedo, julgamento em 15 de março de 2023.

[8] Cf.:

Para o estabelecimento do nexo causal entre os transtornos de saúde e as atividades do trabalhador, além do exame clínico (físico e mental) e os exames complementares, quando necessários, deve o médico considerar: I — a história clínica e ocupacional, decisiva em qualquer diagnóstico e/ou investigação de nexo causal; II — o estudo do local de trabalho; III — o estudo da organização do trabalho; IV — os dados epidemiológicos; V — a literatura científica; VI — a ocorrência de quadro clínico ou subclínico em trabalhadores expostos a riscos semelhantes; VII — a identificação de riscos físicos, químicos, biológicos, mecânicos, estressantes e outros; VIII — o depoimento e a experiência dos trabalhadores; IX — os conhecimentos e as práticas de outras disciplinas e de seus profissionais, sejam ou não da área da saúde. (Resolução n.º 2.183, 2018, art.º 2.º)

Autores: Mariana dos Anjos Ramos Carvalho e Silva